A boa nova no apagar das luzes de 2018

A boa nova no apagar das luzes de 2018

Não é demais lembrar, desde 1995 existe a autorização para que, oito anos após a publicação da Lei nº 9.074/95, o Poder Concedente diminuísse os limites de carga e tensão para livre aquisição de energia

Após uma espera de mais de 15 anos, foi finalmente publicado no D.O.U de 28/12/2018 normativo valendo-se da previsão constante do art. 15, § 3º, da Lei nº 9.074/95, que autorizou o Poder Concedente a, a partir de 07.07.2003, reduzir o limite mínimo de carga necessária para que o consumidor possa contratar livremente sua energia elétrica, independentemente de fonte. Trata-se da Portaria nº 514, de 27/12/2018, do Ministério de Minas e Energia, que reduziu o limite mínimo para 2.500 kW e já estabeleceu nova redução para 2.000 kW a partir de 1º de janeiro de 2020.

Não é demais lembrar, desde 1995 existe a autorização para que, oito anos após a publicação da Lei nº 9.074/95, o Poder Concedente diminuísse os limites de carga e tensão para livre aquisição de energia. Nesse ínterim, surgiu a figura do chamado “consumidor especial”, a quem foi permitido adquirir energia elétrica no Ambiente Contratação Livre- ACL, porém somente oriunda de fontes incentivadas (art. 26, §5º, da Lei nº 9.427/96 e art. 1º, §2º, X, do Decreto nº 5.163/04).

A nosso ver, procedeu bem o Poder Concedente ao usufruir da autorização legal com a edição de “Portaria” do MME.

Embora parte da doutrina adote o conceito clássico de “Portarias”, como sendo atos administrativos “internos” (“da porta para dentro”), fato é que há muito se verifica outra realidade – na prática, nos tribunais e na doutrina. Ainda em 1974, o Prof. José Cretella Júnior escreveu que “a portaria pode ser interna e externa, geral e especial” (Revista de Direito Administrativo, pp. 447-459). E prossegue ensinando, com precisão, que “na órbita exterior, dirigindo-se ao público, reúne a portaria traços de generalidade e coatividade, mas não de novidade. Portaria não inova, não cria, não extingue direitos, não modifica, por si, qualquer impositivo da ordem jurídica em vigor”.

Em rápida pesquisa pelas Portarias publicadas pelo MME, vê-se que seu conteúdo é variado, ora tratando de simples nomeações e exonerações, ora estabelecendo o funcionamento de leilões de energia, por exemplo. Ademais, o uso de portaria permite uma maior flexibilidade ao Poder Concedente para eventual nova alteração dos limites, em linha com a Política Energética do País.

A alternativa seria a redução por meio de decreto. Contudo, deve ser destacado que decretos servem para regulamentar leis, o que parece desnecessário no caso do art. 15, §3º da lei nº 9.074/95, que independe de regulamentação, sendo autoaplicável – trata de uma autorização ao Poder Concedente, que vige de plano. O que a Portaria MME nº 514/18 faz, é apenas concretizar uma faculdade do Poder Concedente.

Diferente seria uma eventual alteração dos limites para enquadramento como “consumidor especial”, dado que tais limites estão expressos em Lei e em Decreto, não sendo possível a inovação por Portaria.

Não há que se falar, portanto, em qualquer insegurança jurídica, a nosso ver.

Superada a questão jurídica, importa uma breve análise do impacto da medida nas relações do setor. Embora a diminuição do limite de carga proposta pela Portaria não implique em aumento imediato do ACL – os consumidores com carga entre 2.000 kW e 3.000 kW já podiam se estabelecer como “consumidores livres” -, a medida (i) potencialmente aumenta a atratividade da migração para os consumidores que atenderem o novo limite de carga, dado que esses poderão adquirir energia de qualquer fonte – maior oferta deveria levar a menor preço -; e (ii) retira a limitação para aqueles consumidores especiais com carga acima de 2.000 kW, reduzindo a “reserva de mercado” das incentivadas.

Em razão desses dois impactos da Portaria é que, entendemos, a adoção de uma redução gradativa foi bastante prudente, pois dá aos agentes do setor tempo para adaptação.

A Portaria é mais que bem-vinda e mostra disposição dos órgãos e entidades do setor para enfrentar questões práticas e propor mudanças. Boas perspectivas para 2019!