Em Busca de Uma Regulação Adaptativa para o Setor Elétrico no Brasil

Em Busca de Uma Regulação Adaptativa para o Setor Elétrico no Brasil

Redução da demanda, geração renovável não contratada e mudança nos critérios de aversão ao risco precisam ser equacionados para evitar o aumento do risco para a geração hidrelétrica.

 

A proposta do governo para a solução de um dos principais problemas que afligem o setor elétrico no país, o GSF, está endereçada na proposta de modernização que foi apresentada pelo MME pouco antes do carnaval deste ano. Contudo, ainda há três fatores que aumentam o risco das hidrelétricas que são a redução da demanda, a geração renovável não contratada e a mudança nos critérios de aversão ao risco. Contudo, na avaliação da consultoria PSR, as medidas propostas para ‘extirpar’ os fatores que não são hidrológicos do MRE e estão contempladas na proposta apresentada estão corretas.

Em sua publicação mensal Energy Report, a consultoria aponta ser importante que a gestão destes fatores seja equacionada, para evitarmos que o problema do GSF volte a ocorrer no futuro. Nesse sentido, a empresa acredita que seria necessária a adoção de mecanismos financeiros para equacionar os riscos dos geradores. Entre eles estão o que a consultoria chama de Demand Reduction Hedge (DRH). Este produto, explicou, protegeria tanto o gerador hidráulico da redução de demanda do sistema como as distribuidoras da sobrecontratação e seria equivalente aos leilões de descontratação de energia e negociações bilaterais atualmente implementados pelas distribuidoras, porém com o diferencial de ser puramente financeiro e ser atrelado ao crescimento de mercado das distribuidoras.

Outra questão ainda que poderia gerar um ativo financeiro é a ocorrência de um racionamento. Nesse caso os contratos seriam reduzidos na mesma proporção, conforme é previsto na legislação atual. “Isto parece razoável, pois é um evento fora do controle da hidrelétrica. No entanto, observa-se inicialmente que esta medida não protege adequadamente a hidrelétrica”, apontou a PSR em sua publicação. “Isto ocorre porque todo o montante racionado resulta em deslocamento da produção hidrelétrica, enquanto o mecanismo de proteção é proporcional ao racionamento percentual (…) quanto menor a participação hidráulica no sistema, menor a eficácia desta medida para as hidrelétricas”, afirmou. Mas, contemporiza ao afirmar que uma proteção parcial é melhor do que nada. Contudo, lembra que a experiência de 2014 e 2015, em que o governo não adotou a decisão tecnicamente recomendável de decretar um racionamento, mostrou a fragilidade do esquema atual.

No segundo fator potencial que não foi abordado pelo resultado da CP 33, a geração renovável não contratada de energia de reserva, a consultoria propõe a criação de instrumentos denominados Financial Hydrogical Rights (FHR). Estes produtos financeiros poderia ser call options e contratos financeiros com preços fixos oferecidos pelas distribuidoras de energia elétrica para o mercado por meio de leilões. As concessionárias de distribuição utilizariam como respaldo para estes produtos a renda spot da energia de reserva, e possivelmente dos contratos por disponibilidade.

A PSR explica que como essa renda da geração de reserva aumenta com o preço spot, ela contrabalança exatamente a exposição das hidrelétricas. E afirma que essa proposta é similar ao Financial Transmission Rights (FTR) que oferece um hedge perfeito contra o risco de diferenças de preços entre submercados.

A consultoria aponta que esse mecanismo também apresenta semelhança com o mecanismo proposto pela Aneel em 2015 para a repactuação do risco hidrológico das hidrelétricas no mercado livre. A proposta na época era que os geradores comprassem a energia de reserva dos consumidores e ficassem com a renda spot. Mas, apontou, não se
mostrou atrativa pelo elevado custo da energia de reserva, que possui uma componente de política energética para o incentivo de fontes renováveis. Adicionalmente, continuou, a contratação da energia de reserva tem como objetivo ampliar a segurança do sistema, o que significa que existe uma componente no seu custo para este serviço.

Em sua proposta, apontou a PSR, o valor pago para esta geração viria da expectativa do mercado para o valor desta
energia no MCP, que poderia ser revelada através de um leilão para a venda destes instrumentos financeiros. “Com esta abordagem, os geradores estariam comprando apenas um produto financeiro cujo valor está atrelado à expectativa do mercado para o preço da energia no mercado de curto prazo. Os custos da energia de reserva referentes à política energética e à segurança de suprimento continuariam a ser arcados pelos consumidores finais”, indicou.

Já no que se refere à mudança no critério de aversão ao risco, afirmou a PSR, embora as medidas propostas pelo governo protejam os geradores hidrelétricos contra uma geração fora da ordem de mérito, é importante observar que mudanças nos critérios de aversão ao risco teriam o mesmo efeito de aumentar a exposição das hidrelétricas. A visão é de que este tema está diretamente relacionado com a diferença entre avaliação sistêmica e individual dos custos de oportunidade da água. Citando o exemplo da Colômbia, aquele país resolveu o problema adotando a oferta de preços.

“Embora a CP 33 tenha deixado em aberto a possibilidade de fazer oferta de preços no Brasil, há duas preocupações recorrentes quando este assunto é discutido. A primeira é se a oferta de preços é compatível com o MRE e a segunda se é possível fazer oferta de preços e manter o critério de segurança de suprimento do sistema desejado pelo governo e ONS”, questionou a consultoria para quem ambas as respostas são positivas. Isso porque na primeira a própria PSR apontou ter desenvolvido em detalhes há alguns anos a oferta de preços ser compatível com o MRE ao repartir ex-ante a energia afluente às hidrelétricas. E para a segunda preocupação os geradores hidrelétricos passarão a ser os responsáveis diretos pelas suas decisões de ofertar ou guardar energia, arcando com os benefícios e prejuízos.

A CP 33 propôs medidas para retirar os riscos do MRE que não possuem natureza hidrológica. De acordo com o governo, seriam extirpados os efeitos da antecipação de garantia física outorgada aos empreendimentos estruturantes, superestimando a GF durante o período de motorização da usina, os efeitos dos atrasos nas linhas de transmissão que escoam a energia elétrica gerada por tais empreendimentos e o acionamento das termelétricas não justificado pelo modelo de política operativa ótima a chamada geração fora da ordem de mérito.