Impacto da sobra de oferta

Impacto da sobra de oferta

Com queda de investimentos, cogeração não deve entregar um único quilowatt adicional de energia em 2024.

Preservadas as condições atuais, a indústria da biomassa não deverá entregar ao mercado um único quilowatt de energia nova em 2024, segundo o mais recente relatório de acompanhamento de expansão da oferta de energia elétrica da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A expansão da capacidade instalada nesta área vem caindo ano a ano praticamente desde o início da década.

De acordo com Zilmar José de Souza, gerente de bioeletricidade da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), o recorde de 2010 permanece imbatível, quando foram acrescidos 1.750 megawatts à capacidade do setor, correspondendo a um terço de toda a energia nova adicionada ao sistema elétrico brasileiro. Entre altos e baixos, a capacidade instalada de bioeletricidade desabou para 917 MW em 2012, para subir até 1.431 MW no ano seguinte, despencando novamente nos anos seguintes. Em 2016, incorporou outros 807 MW, o mais baixo desde 2008, representando só 8% de toda a energia nova agregada à rede.

Para este ano, segundo Souza, espera-se o acréscimo de outros 382 MW, quase metade do que foi adicionado em 2016. Isso deverá corresponder a apenas 8% de toda a capacidade nova que o Setor de energia elétrica deverá criar em 2017, porque não são esperados avanços em
função da redução de investimentos, da queda na demanda e do atraso na entrada de projetos de geração. Para 2018, o cenário desenhado pela Aneel será pior, com a entrada de 105 MW ou 1% do aumento projetado para o conjunto da geração.

O resultado tem sido um avanço mais modesto da capacidade instalada no setor como um todo. Incluindo todas as fontes, a biomassa registrou em 2016 uma variação de 4,8% em sua capacidade, saindo de 13.992 MW em 2015 para 14.669 MW. Na mesma linha, mas com intensidade diversa, a venda de energia da biomassa para o Sistema Interligado Nacional (SIN), que havia registrado alta de em 2015, atingindo 22.572 gigawatts/hora, conforme dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), aumentou 6,3% no ano passado, para 23.983 GWh.
A expectativa é de que não sejam realizados leiloes específicos para a biomassa neste ano, o que torna as perspectivas para o setor menos promissoras. Na estimativa da Thymos Energia, a sobrecontratação estaria em torno de 9 gigawatts médios, o que obrigará a realização pelo governo de um “leilão reverso“, para recompra da energia que está “sobrando” no sistema. “Não será uma equação simples, porque a modelagem desse leilão deve criar condições que sejam atraentes para as distribuidoras e, ao mesmo tempo, que não incentivem a irresponsabilidade”, afirma Geraldo Mota, diretor do grupo Delta Energia.

A possibilidade de novos avanços para a geração da biomassa neste ano dependerá em grande medida do sucesso do leilão de descontratação, ainda sequer desenhado pela Aneel. Se bem-sucedido, afirma Thais Prandini, diretora da Thymos, a biomassa poderá ter espaço em um próximo leilão de energia de reserva, caso essa possibilidade venha a ser contemplada pela agência.

Diante dos baixos níveis dos reservatórios no fim do período de chuvas, a Aneel anunciou a aplicação da bandeira tarifária vermelha em abril, o que veio acompanhado de uma elevação de praticamente 81% nos preços de liquidação de diferenças na primeira semana daquele mês, saindo de R$ 235,67 para R$ 426,10 na média das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul, conforme a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Esse aumento, sugere Mota, poderá igualmente estimular a cogeração.

As fontes de energia a partir da biomassa continuam desempenhando um papel essencial para a segurança do sistema interligado, afirma Thais. “Há um interesse renovado dos investidores.” A participação da biomassa deve continuar crescendo no longo prazo, notadamente nos casos da cana e do eucalipto. ”A diminuição no número de projetos hidrelétricos, em função de uma série de restrições, tenderá a abrir espaços para outras fontes, favorecendo o desenvolvimento do potencial da biomassa.”

A questão, retoma Souza, numa opinião compartilhada por Newton Duarte, presidente executivo da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen), é que a falta de previsibilidade das políticas para o setor e a descontinuidade na contração de energia nos leilões penalizam os investimentos e iniciativas como melhor aproveitamento da palha na cogeração e mesmo do biogás produzido a partir da vinhaça. Por isso, sustenta Souza, “não há previsão de entrada de novas usinas na cogeração e nem de investimentos em expansão de capacidade”.

Segundo Duarte, a Cogen tem atuado para tentar amenizar as condições pouco amistosas observadas no mercado. Desde 2015, com a Medida Provisória 706, convertida na Lei 13.299, de junho de 2016, o teto para contratação de energia incentivada, com desconto de 50% nas tarifas Uso do Sistema de Transmissão e de Distribuição de Energia Elétrica (Tust e Tusd, respectivamente), foi elevado de 30 para 50 MW. “Isso permitirá uma geração adicional de 500 MW médios para as usinas que têm cogeração, sem necessidade de ampliar o parque, com os mesmos ativos imobilizados de hoje.”

Ao mesmo tempo, introduziu-se maior maleabilidade na avaliação dá garantia física de geração de bioeletricidade. “Agora, uma usina poderá gerar entre 90% e 105% da energia contratada sem perder a garantia física anterior. Os limites que vigoravam antes flutuavam entre 95% e 105%”, diz Duarte.