Mais uma vez empresas e consumidores comuns vão pagar a conta

Mais uma vez empresas e consumidores comuns vão pagar a conta

Tem um ditado catastrófico que diz: “nada está tão ruim que não possa piorar”. Ao que se sabe, é uma das máximas da famosa lei de Murphy que garante que se alguma coisa pode dar errado, dará. E mais, dará errado da pior maneira, no pior momento e de modo que cause o maior dano possível. Ou seja, se está bom, pode ficar ruim; se está ruim, pode piorar.

Pode parecer pessimismo, mas não é.  Essa é a sensação atual dos consumidores brasileiros de energia elétrica em geral, especialmente das empresas, cujas contas não fecham há muito tempo e que podem piorar um pouco mais.

Uma decisão da Aneel, a Agência Nacional de Energia Elétrica, promoverá um aumento médio de 7,17% nas contas de luz das empresas e das residências de todo o país, a partir de julho deste ano e até 2024.

O índice pode variar para mais ou para menos, pois, conforme destaca a Aneel, deve-se somente ao item transmissão de energia elétrica, extraindo outros fatores que afetam a tarifa. No entanto, uma coisa é certa: consumidores que estão em regiões mais distantes das usinas de geração e onde há mais consumo de energia, como algumas áreas do Sudeste, devem sentir impacto maior.

Segundo a Agência, o rateio é para pagar indenizações bilionárias – da ordem de R$ 62 bilhões – às empresas de transmissão de energia que, durante o primeiro governo de Dilma Rousseff, tiveram que aceitar a renovação antecipada das concessões.

As empresas mudaram seus contratos sob a promessa de que seriam indenizadas para cobrir os gastos que tiveram com obras de modernização das redes que fizeram até o ano de 2000.

À época, uma medida provisória assinada por Dilma Rousseff alterou o marco regulatório do setor elétrico, retirou encargos da tarifa de energia, permitindo, em 2013, a redução de cerca de 20% na conta de energia elétrica dos consumidores.

Como disse a jornalista Miriam Leitão, em sua coluna de O Globo, o primeiro erro foi misturar política com decisões econômicas e baixar preços para usar como moeda eleitoral. Naquele ano – diz -, Dilma gravou o comunicado ao país sobre a queda dos preços tendo ao seu lado o marqueteiro João Santana. Não era ano eleitoral, mas o plano era preparar uma peça publicitária.

A indenização para as distribuidoras deveria ter começado a ser paga já em 2013, mas o governo, sem dinheiro e preocupado em não desagradar, foi empurrando com a barriga e a conta salgada está chegando agora.

E surge num momento infeliz, quando as empresas estão tentando reagir contra a situação crítica do país, buscando forças para retomar a produção. Momento infeliz também para os desempregados que vislumbravam a volta das contratações a partir deste ano. Tudo pode ser adiado.

O valor das indenizações foi alvo de pesadas críticas por parte das indústrias eletrointensivas representadas pela Abrace – Associação Brasileira de Grandes Consumidores de Energia -, que participou da reunião da Aneel e ameaçou ir aos tribunais para evitar um forte aumento de custos com os pagamentos.

“Parece que estamos sendo induzidos a ir à Justiça, que é o que não se quer”, lamentou o presidente da Abrace, Edvaldo Santana, que era diretor da Aneel na época em que o governo Dilma prometeu reduzir as tarifas.

O superintendente da Abividro – Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro -, Lucien Belmonte, afirmou que a entidade está pronta para entrar na Justiça contra a proposta. “Não vamos incorporar essa história de aumento de conta de luz de novo”, disse.

O próprio diretor da Aneel, Reive de Barros, que relatou o processo, fez críticas ao pagamento da indenização. Segundo ele, o atraso no pagamento incrementou a conta em R$ 35 bilhões, que é o custo financeiro dentro do cálculo total. “O fato de não ter sido pago naquela época imputou hoje valor considerável para o consumidor, que não teve gestão na decisão de pagar ou não”, disse Barros.

Para Carlos Faria, presidente da Anace – Associação Nacional dos Consumidores de Energia -, a decisão publicada pela Aneel é totalmente indecente e não se sustenta em seus argumentos. Ele contesta também a forma como está sendo informada a decisão: “não acreditamos que uma portaria da Aneel tenha força de Lei e que possa definir a cobrança”.

Faria informou que a Anace poderá judicializar os diversos aspectos da portaria, especialmente o que diz respeito ao cálculo das indenizações. “Temos que questionar se o valor é devido e se deve ser pago pelo consumidor”, declarou.

Pelo exposto, ao transferir às empresas e ao consumidor comum o ônus de pagar a conta, pode-se concluir de que se trata de mais um legado cruel do governo afastado. Há que se buscar outra saída.