Temor de apagão puxa vendas de geradores

Temor de apagão puxa vendas de geradores

Fabricantes relatam alta de até 35% dos pedidos e cotações por geradores a diesel e gás

O temor de apagões fez disparar a procura no mercado por grupos geradores, equipamentos movidos a diesel ou a gás que entram como “backup” de fornecimento de energia em empresas e condomínios residenciais.

Segundo fabricantes, a demanda já mostrava tendência de alta, associada às necessidades de reforço das operações em setores que não pararam durante a pandemia, como hospitais, indústria alimentícia e data centers. Mas a busca pelos geradores se intensificou recentemente, num movimento semelhante ao assistido na crise energética de 2001.

Na Stemac, uma das maiores nesse segmento, o volume de cotações e pedidos subiu 35% nos dois últimos meses. “Já vínhamos enxergando um crescimento orgânico neste ano, com a visão mais otimista das empresas em relação à economia e com o avanço da vacinação. Mas nos parece que isso foi acelerado pelas notícias da crise hídrica”, afirma Valdo Marques, vice-presidente executivo. Instalada em Itumbiara (GO), a Stemac costuma vender, em média, de 3.500 grupos geradores por ano no mercado brasileiro.

“O cenário de hoje representa um risco muito grande para quem têm a energia elétrica como um componente estratégico do seu negócio. As empresas estão acompanhando as decisões do setor elétrico, mas já estão se preparando para um cenário que pode vir pela frente. Muitos estão procurando locação ou mesmo compra de geradores”, afirma Carlos Faria, presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace).

O aumento da procura também foi notado pela Geraforte, com matriz em Contagem (MG). “Existe uma preocupação por parte das empresas mais precavidas e, em alguns casos, o adiantamento de projetos envolvendo geradores a diesel que estavam parados ou em andamento normal”, contam Denancir Filipin e Márcio Martins, diretores da empresa.

Além de setores ligados a atividades essenciais, as fabricantes relatam que a construção civil, a agroindústria e shoppings têm puxado a demanda neste ano. Outro destaque é o segmento residencial. “É uma mudança cultural que enxergamos no Brasil, lá fora é bem mais comum casas e condomínios terem geradores como fonte de energia alternativa”, avalia Marques.

Paulo Nielsen, líder da Cummins Power Generation para a América Latina, afirma que algumas empresas têm buscado geradores não só para atuar em emergências, mas também para substituir o uso da rede nos horários de “ponta”, normalmente no fim da tarde e à noite. Ao acionar esses equipamentos nas horas do dia em que a energia está mais cara, as empresas conseguem economizar na conta de luz.

“Se o governo e as autoridades conseguirem mitigar esse risco [de racionamento], acreditamos que a demanda por geradores não terá um pico tão grande. Hoje, prevemos um crescimento de 20%”, afirma Nielsen.

Os grupos geradores já são bastante adotados em operações consideradas “críticas”, como hospitais, data centers e algumas indústrias. O racionamento de 2001 também impulsionou a adoção desses equipamentos por parte dos consumidores, até como forma de gerenciar sua carga nos horários de ponta.

Porém, o uso desse tipo de equipamento é limitado e serve principalmente como uma medida defensiva, ressalta Nivalde de Castro, professor e coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), da UFRJ. “Os geradores são para pequenas e médias empresas usarem em emergências ou então nos horários de ‘ponta’, durante pouco tempo. Além disso, é uma energia cara, já que são movidos a diesel.”

Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), a capacidade instalada de grupos geradores, em posse dos consumidores, é relevante. Em sua última análise do tema, elaborada em 2015, a EPE identificou que esse parque tinha um potencial de “afundamento” da curva de carga do Sistema Interligado Nacional (SIN) de 7.000 a 9.000 megawatts (MW) em horários de ponta.

Apesar da movimentação crescente no mercado, as fabricantes não esperam ver uma corrida tão grande por equipamentos como a vivida em 2001, quando as vendas chegaram a crescer 10 vezes. Porém, já estão se preparando para aumentar o volume de produção, caso a demanda siga escalando.

A fábrica da Stemac em Goiás tem uma capacidade produtiva de 15 mil unidades por ano e hoje opera com folga. Diante das dificuldades enfrentadas por toda a indústria com a falta de matéria-prima e componentes, a companhia já está montando planos de contingência com a cadeia de fornecedores.

Já a unidade da Cummins em Guarulhos (SP) tem 20% de capacidade “ociosa” para produção de grupos geradores. No limite, a companhia entende que poderia importar de outros países onde atua, caso a demanda se mostre muito acima da esperada. “No apagão de 2001, estávamos começando a iniciar a produção no Brasil. Na época, conseguimos acionar as plantas globais para ajudar”, diz Nielsen.

Para especialistas, os grupos geradores são um recurso importante para o sistema elétrico, mas que acaba sendo desconsiderado. “Temos no Brasil uma capacidade instalada muito grande desses geradores, que só são usados poucas horas por dia. Acabamos não contando com esse recurso”, afirma Roberto Brandão, professor e pesquisador sênior do Gesel-UFRJ.

Na visão de Brandão, o país poderia estudar a implementação de um sinal de preço para ajudar o consumidor a decidir sobre o acionamento desses equipamentos, a fim de reduzir seu consumo aparente. “Ter um mecanismo desses poderia ser útil. Mesmo que fosse uma redução pequena do consumo total, numa situação apertada [de fornecimento de energia] como a que vivemos, talvez faça a diferença”, diz.

Confira a notícia completa em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/06/18/temor-de-apagao-puxa-vendas-de-geradores.ghtml