Votação no Congresso reacende debate sobre geração distribuída

Votação no Congresso reacende debate sobre geração distribuída

PL 5829/2019 cria marco regulatório para a modalidade e mantém subsídios que opõem alas do setor elétrico

Por Letícia Fucuchima e Rafael Bitencourt

O debate sobre a geração distribuída de energia voltou a esquentar com as sinalizações de que a Câmara dos Deputados poderá colocar em votação, em breve, o Projeto de Lei (PL) 5.829/19, que institui um marco regulatório para o segmento.

Em paralelo, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), pressionada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), está avançando com a revisão das regras aplicáveis à micro e minigeração distribuída. Na semana passada, a área técnica da agência concluiu sua avaliação e optou por um cenário que desagradou os agentes atuantes nesse mercado.

PL 5829/2019 cria marco regulatório para a modalidade e mantém subsídios que opõem alas do setor elétrico

Ontem, diferentes lados da história vieram a público divulgar seus cálculos sobre o impacto da geração distribuída para o setor elétrico nos próximos anos. Em ambos os casos, as cifras alcançam vários bilhões de reais – mas com sinais trocados.

Segundo estudo da consultoria PSR, a manutenção dos subsídios à geração distribuída, contida no PL 5829/2019, poderá custar R$ 135 bilhões ao longo dos próximos 30 anos para os consumidores que não adotarem a modalidade. Durante entrevista coletiva, o presidente da PSR, Luiz Barroso, ressaltou que os consumidores que usufruem da geração distribuída não estão arcando com os “custos totais” dos sistemas, que incluem despesas com aquisição de outras fontes de energia, com a rede e impostos. “Estes custos voltam para os demais consumidores”, disse.

A geração distribuída, ou “GD”, é o modelo no qual o consumidor gera sua própria energia, através da instalação de usinas com até 5 megawatts (MW) de potência no próprio local de consumo ou próximo a ele. Atualmente, a imensa maioria dos projetos é de energia solar fotovoltaica. Um dos atrativos da GD, que ajuda a explicar seu forte crescimento nos últimos anos, é o desconto garantido na conta de luz: os consumidores acumulam descontos quando geram energia excedente e não pagam por alguns componentes tarifários, como uso da rede de distribuição e encargos.

A perspectiva de um rombo bilionário criado pelos subsídios cruzados à geração distribuída é defendida por associações que representam consumidores (Idec, Conacen, Abrace, Anace) e distribuidores de energia elétrica (Abradee e Abrademp).

Esse grupo de entidades argumenta ainda que, além de jogar custos adicionais a outros consumidores, a geração distribuída penaliza quem tem menor poder aquisitivo. Segundo o coordenador do Programa de Energia e Sustentabilidade do Idec, Clauber Leite, a maior adesão à GD está em bairros mais nobres ou onde se concentra a maior parte da atividade econômica da cidade. “Quem realmente precisa não está sendo beneficiado.”

Em contraponto a essas críticas, o mercado de geração distribuída também divulgou, ontem, suas projeções. Ao invés de prejuízo para os consumidores, calculam um benefício líquido de R$ 50 bilhões com o crescimento da geração distribuída até 2035.

O número foi apresentado pelo Instituto Nacional de Energia Limpa (Inel) e pela Associação Baiana de Energia Solar (ABS), em coletiva organizada por várias entidades que apoiam uma transição suave das regras para a modalidade, como a ABGD, Abiogás e a ABRAPCH.

O principal argumento das entidades ligada à GD é que nem a Aneel, nem seus “opositores” estão considerando, nos cálculos, os benefícios sistêmicos trazidos pela modalidade. Eles defendem uma abordagem mais “holística” da GD, que considere a avaliação e mensuração de eventuais benefícios relacionados a menores perdas elétricas, menor uso de termelétricas e postergação de investimentos em novas usinas de geração, redes de transmissão e infraestrutura de distribuição.

A Absolar também estima benefícios da geração distribuída para o setor elétrico. Com base nas suas projeções de mercado, calculou que esse montante chegaria a R$ 13,3 bilhões até 2035, já descontados os custos.

Na visão das entidades ligada à GD, o que realmente incomoda os grandes grupos tradicionais do setor elétrico é a perda de mercado. “Tem muita coisa para consertar no setor, mas o problema da tarifa não é a GD”, afirmou Paulo Arbex, presidente da ABRAPCH. Para ele, a geração distribuída permite que o consumidor seja “realmente livre”, deixando de depender das distribuidoras e comercializadoras, os “intermediários” dos mercados regulado e livre.

A revisão das regras já devia ter acontecido em 2019, mas encontrou resistências e foi alvo de forte polêmica, envolvendo até declarações do presidente Jair Bolsonaro de que o governo não iria “taxar o sol”. As discussões esfriaram com a chegada da pandemia e voltaram à tona em novembro do ano passado, quando o TCU deu à Aneel prazo para apresentar um plano de ação para o tema.

Nos últimos meses, as discussões esquentaram nas redes sociais, inclusive com troca de acusações nos bastidores.

A expectativa é de que a agência decida sobre a mudança até 30 de junho. A Absolar fez duras críticas ao último relatório da área técnica da Aneel, dizendo que a opção encontrada “ameaça” a energia solar e demais fontes que usam a modalidade, e representa uma “preocupante quebra de confiança” com o Congresso, que pode votar em breve a criação do marco regulatório.

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