Emendas no PLC77 caem no bolso do consumidor

Emendas no PLC77 caem no bolso do consumidor

Entretanto, para que o mercado se interesse pelas distribuidoras, caberá aos consumidores o ônus da ineficiência do Estado

Somente após o primeiro turno das eleições, no dia 9 de outubro, quando os cargos legislativos já estiverem definidos, é que o Senado deve votar o Projeto de Lei da Câmara nº. 77. O PLC, que na Câmara era conhecido como PL 10.332, estabelece medidas para tornar as distribuidoras que estavam sob concessão da Eletrobrás mais atrativas para o mercado, facilitando sua privatização.

Entretanto, para que o mercado se interesse pelas distribuidoras, caberá aos consumidores o ônus da ineficiência do Estado. O projeto retira dessas empresas a responsabilidade por problemas técnicos e furtos, popularmente conhecidos como gatos: o ressarcimento de prejuízos com perdas comerciais que Eletroacre (Acre) e Ceron (Rondônia) tiveram desde 2009 são transferidos para todos os usuários do sistema elétrico via Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo cuja maior parte dos recursos é paga pelos consumidores por meio da conta de luz.

É um peso magnânimo no bolso dos consumidores. Estima-se que somente essa medida tenha um impacto anual de aproximadamente R$ 800 milhões. As duas distribuidoras foram privatizadas no final de agosto e, como o PLC 77 ainda está em tramitação, o edital de licitação não previa esse benefício – ou seja, o consumidor terá de arcar com as perdas até a revisão tarifária de cada uma delas, que deve ocorrer daqui a quatro ou cinco anos.

Esta não é a única novidade a pesar no bolso dos consumidores. Dentre as medidas, consta também a determinação para que o preço do gás natural fornecido às usinas termelétricas contratadas pelo Programa Prioritário de Termelétricas (PPT) seja reajustado – o programa incentiva a geração de energia elétrica a partir da implantação de plantas térmicas a gás natural , que é fornecido pela Petrobras; mas os valores do gás estão defasados em relação ao mercado e prejudicam a estatal. A diferença de preço, porém, terá de sair da CDE.

O PLC 77 propõe ainda a reformulação da Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE), com a substituição do desconto escalonado na tarifa pela gratuidade para o consumo até 70 kW mensais. Atualmente, o usuário de baixa renda que consome até 30 kWh/mês, por exemplo, tem desconto de 65% na tarifa, que cai para 40% para quem está na faixa de 31 kWh a 100 kWh/mês. Os que estão na faixa de 101 kWh a 220 kWh têm 10% de desconto. A gratuidade é coberta, mais uma vez, pela CDE. Em 2018, a Tarifa Social vai representar um desembolso de R$ 2,44 bilhões.

Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o orçamento da CDE para 2018 deve ficar em R$ 20,053 bilhões, dos quais 90%, cerca de R$ 18 bi, é proveniente das contas de luz. O restante vem de pagamentos anuais realizados pelos concessionários a título de Uso de Bem Público (UBP), de multas aplicadas pela Aneel e da transferência de recursos do Orçamento da União. Todavia, a CDE, que é um encargo, vem sendo utilizada para pagar tantas despesas extras que já se pode confundi-la com um tributo disfarçado.

Energia é um insumo fundamental para o desenvolvimento econômico e social de um país, e a Associação Nacional dos Consumidores de Energia (ANACE) acredita que políticas públicas devem contribuir para que todos tenham acesso a ela, de forma eficiente e a preços competitivos. A inclusão das distribuidoras da região Norte no Plano Nacional de Desestatização favorece a dinamização do setor e ajuda a resolver importantes gargalos do nosso sistema elétrico.

Celebrado por agentes do setor, o PLC77 traz avanços importantes não só para resolver a questão das distribuidoras designadas – cuja concessão já estava vencida desde 2015 e corriam o risco de serem liquidadas – mas também para os imbróglios ligados ao risco hidrológico. Todavia, é importante questionarmo-nos se onerar o consumidor para salvar as distribuidoras pode ser considerado um ato político em benefício do povo, como prevê o próprio conceito de política pública.

Carlos Faria é presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (ANACE).