Usinas do Madeira perdem 50% da geração

Usinas do Madeira perdem 50% da geração

Atendimento à carga recorde mostra robustez do sistema, diz Barata, do NOS.

As hidrelétricas do complexo do rio Madeira (RO), que somam mais de 7 gigawatts (GW) de potência, estão “jogando fora” praticamente metade da energia que poderia ser gerada, justamente no período de cheias do rio, devido a problemas distintos nos dois linhões que levam a energia da região ao resto do país. Até o fim da semana passada, as megausinas Jirau e Santo Antonio já tinham vertido mais de 2 mil MW médios. As linhas de transmissão estão com 50% de capacidade de escoamento, e não há previsão de normalização.

Em 13 de janeiro, uma falha em um transformador conversor de uma subestação de Porto Velho obrigou ao desligamento do Polo 1 do primeiro linhão do Madeira, operado pela Eletronorte. O fato foi comunicado ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e técnicos e representantes da empresa fornecedora dos equipamentos com problemas, a ABB, foram convocados para avaliar os danos.

Em 18 de janeiro, foi a vez de uma falha no Polo 3, do segundo linhão do Madeira, concessão operada pela ISA Cteep. Segundo a companhia, durante análises periódicas da qualidade do óleo isolante, foi identificada uma alteração em um transformador da estação conversora de Araraquara (SP), que poderia levar a perda do equipamento. A previsão de finalização da substituição desse transformador é no sábado.

No caso do Polo 1, a fornecedora dos equipamentos prevê divulgar um relatório apontando a causa da falha até o início de fevereiro. “A ABB está desmontando algumas partes do Polo 1, mandando as peças para Guarulhos. Os equipamentos serão despachados para a Suécia, para passarem por testes de laboratório para que as causas da falha possam ser encontradas”, disse Glauco Freitas, vice-presidente de Power Grids da ABB no Brasil. Enquanto a “causa raiz” não é diagnosticada, a companhia já está fabricando os equipamentos danificados na Suécia. Eles devem ficar prontos até o fim de fevereiro.

Enquanto isso, o linhão opera com os Polos 2 e 4. “De fato, estamos com a produção do madeira limitada a dois polos e às máquinas ligadas diretamente em Rondônia, o que impõe uma restrição de cerca de 3 mil MW do Madeira”, disse, ao Valor, Luiz Eduardo Barata, diretor-geral do ONS.

Em nota, a Aneel disse que está acompanhando, por meio da sua área de fiscalização, as questões associadas às indisponibilidades de instalações de transmissão associadas ao escoamento das usinas do rio Madeira. Foram solicitados detalhamento das causas dos problemas e as providências tomadas para que sejam resolvidos.

O problema deve alcançar, de certa forma, todas as hidrelétricas do país, que fazem parte do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE, espécie de condomínio que reúne toda energia hídrica gerada). Como essa época do ano costuma ter abundância de chuvas, as usinas acabam contando com energia secundária (quando a energia gerada supera as garantias físicas das hidrelétricas), o que garante ganhos no mercado à vista de energia. Sem a geração prevista do Madeira, a energia secundária deve cair, podendo até mesmo se tornar o temido GSF (sigla em inglês para risco hidrológico).

A questão ganha mais relevância justamente por ser o período de cheia do rio. Na quarta-feira da semana passada, foi realizada a primeira reunião do ano da Sala de Crise do Madeira, que avaliou as condições meteorológicas atuais e previstas que apontaram a possibilidade de precipitações importantes na região, informou a Agência Nacional de Águas (ANA). Foi decidido que as reuniões serão mais frequentes, e que o ONS vai monitorar a situação dos níveis, vazões e operação dos reservatórios com boletins, a fim de preparar medidas necessárias para manter o trânsito na BR-364, que pode ser alagada e prejudicar o acesso terrestre ao Acre.

Além disso, a usina de Angra 2, com 1.350 MW, ficou indisponível entre quarta e sexta-feira da semana passada. Na quarta-feira, o país importou 1.200 MW da Argentina e 400 MW do Uruguai, a fim de atender a demanda recorde registrada no meio da tarde, de 89 GW.

“O sistema teve vários percalços e perturbações, mas continuamos mesmo assim suprindo toda a carga, sem apertar a frequência e mantendo o sistema em operação, o que mostra que o sistema é robusto”, disse Barata.

No dia do recorde, o sistema estava ainda sem a energia da megausina de Belo Monte, no rio Xingu (PA). Em 13 de janeiro, o ONS foi informado da queda de três torres de transmissão do primeiro linhão da hidrelétrica, devido a eventos climáticos em Goiás. Segundo uma fonte, durante os 10 dias em que a energia da hidrelétrica deixou de ser transmitida para o restante do país, deixaram de ser gerados 3.500 MW médios.

Questionado sobre a energia que deixou de ser gerada, Barata não confirmou os valores, mas disse que o ONS estima que as duas “perturbações” no sistema reduziram em 0,7% a 0,8% os reservatórios do submercado Sudeste/Centro-Oeste. “Essas duas semanas de janeiro foram uma conjugação de más notícias, mas apesar de tudo, o sistema funcionou e funcionou adequadamente”, disse Barata.

Além dos problemas físicos na operação do sistema, as chuvas também vieram muito abaixo do esperado em dezembro e janeiro, o que ajudou a acelerar o deplecionamento dos reservatórios, em uma época em que, em geral, eles são preenchidos para que o sistema chegue com segurança de abastecimento ao período seco do ano, a partir de maio. Para efeito de comparação, os reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste subiram de 18,82% no início de dezembro de 2017 para 31,18% da capacidade máxima no fim de janeiro do ano passado. Em 1º de dezembro de 2018, os mesmos reservatórios estavam com 24,25% da capacidade total. No domingo, 27 de janeiro, estavam com 27,31%.