A ilusória economia no regime de cotas
Cinco anos atrás, a presidente Dilma anunciava em cadeia nacional uma redução média de 20,2% nas tarifas de energia elétrica. A maior parte da redução viria da adoção da renovação de concessões hidrelétricas no regime de cotas introduzida pela Medida Provisória 579 de 11/9/2012. Como num passe de mágica, o governo pretendia promover, por decreto, uma drástica redução do custo da eletricidade.
O plano era que o governo quitaria o saldo remanescente dos ativos ainda não depreciados das hidrelétricas que aderissem ao novo regime de concessões, eliminando a necessidade de incluir nas tarifas a remuneração do capital investido na instalação das usinas. Além disso, o novo regime alterava os termos de suprimento: 1) as concessionárias seriam responsáveis apenas pela manutenção das hidrelétricas; e 2) os consumidores “cotistas” passariam a repartir a energia produzida, assumindo o risco hidrológico.
Portanto, como os geradores hidrelétricos estariam livres do risco hidrológico (que agora passava para os consumidores), parte das tarifas de energia já não incluiria um prêmio pela gestão de risco, passando a cobrir apenas custos de operação e manutenção das usinas que passassem a operar nas novas regras.
O governo Dilma previa que, com essas alterações, o custo de energia dessas hidrelétricas seria reduzido em cerca de dois terços.
Passados cinco anos, os inconvenientes dessa forma de contratação de energia tornam-se evidentes, e o consumidor já pode perceber que a suposta economia atribuída ao novo regime de concessões não passou de ilusionismo. Isto fica demonstrado quando se examina o custo efetivo das usinas hidrelétricas no regime de cotas.
O custo efetivo da energia no regime de cotas tem vários componentes, a começar pelo valor nominal da cota, que em 2017 foi de R$ 51/MWh, valor obtido pela divisão da “Receita Anual da Geração” (RAG) dessas usinas (R$ 5,3 bilhões) pelo montante lastreado pelos contratos (11,8 GW médios). No entanto, é necessário adicionar os demais custos.
Em 2017, por exemplo, os consumidores atendidos pelos “Contratos de Cotas de Garantia Física” tiveram que adquirir energia no Mercado de Curto Prazo para complementar o seu suprimento a um custo médio ponderado de R$ 476/MWh, o que somou cerca de R$ 6,8 bilhões no ano (ou R$ 69/MWh).
Há ainda os R$ 12,3 bilhões (atualizados pelo IPCA para jan/2018) em indenizações a serem pagas aos concessionários pelos ativos ainda não depreciados (valor ainda sub judice). Quando esse montante é anualizado por 20 anos de concessão, temos outros R$ 9 a 15/MWh (dependendo da taxa de remuneração do capital considerada).
A soma dos três componentes acima varia entre R$ 129/MWh e R$ 135/MWh, valor sempre superior ao “Valor de Referência” (custo médio da energia de novos empreendimentos contratados nos Leilões de Energia), que foi de R$ 125/MWh em 2017. Vale lembrar que a cada cinco anos a RAG é revisada e que na primeira revisão, que ocorrerá em 2018, se estima sua elevação em 16% para contemplar os investimentos feitos no período.
Na prática, em 2017 o custo da energia das usinas no regime de cotas – que teoricamente deveriam ser as usinas mais baratas do sistema – foi maior do que o de novas usinas. É claro que em períodos de geração hidrelétrica abundante os preços no regime de cotas serão menores.
No entanto, o aspecto mais danoso do regime de cotas é a eliminação da gestão ativa do risco hidrológico, que passa a ser arcado pelo consumidor de forma passiva.
A adoção do regime de cotas também tem efeitos perversos no mercado de energia, pois elimina uma parcela grande da “Energia Existente” que proporcionava liquidez para lidar com as oscilações da oferta e demanda.
É por isso que faz sentido a “descotização” de parte dos contratos no regime de cotas, conforme propõe o Projeto de Lei 9.463/2018 em tramitação no Congresso Nacional.