A legislação permite a redução dos limites de carga para os consumidores livres por meio de Portaria

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A legislação permite a redução dos limites de carga para os consumidores livres por meio de Portaria

Consulta Pública MME nº 63/2018 visa diminuir os limites de carga para contratação de energia elétrica por parte dos consumidores.

É natural que grandes avanços do setor elétrico causem discussões entre os agentes de mercado, o “tema do momento” é a publicação da Portaria MME nº 495, de 10 de dezembro de 2018, que trata da abertura da Consulta Pública MME nº 63/2018.

O objetivo da consulta, cujo prazo de contribuição encerra-se em 17.12.2018, é regulamentar o disposto no art. 15, § 3º, da Lei nº 9.074, de 07 de julho de 1995.

Ou seja, a Consulta Pública MME nº 63/2018 visa diminuir os limites de carga para contratação de energia elétrica por parte dos consumidores.

Pois bem. A grande dúvida que surgiu no setor é acerca da possibilidade dessa redução ser materializada por meio de Portaria.

(a) Proposta do Ministério de Minas e Energia – MME

A proposta do MME é a redução dos limites de carga para contratação de energia por parte dos consumidores, por meio de portaria, nos termos a seguir:

Art. 1º Regulamentar o disposto no art. 15, § 3º, da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, com o objetivo de diminuir os limites de carga para contratação de energia elétrica por parte dos consumidores.
§ 1º A partir de 1º de julho de 2019, os consumidores com carga igual ou superior a 2.500 kW, atendidos em qualquer tensão, poderão optar pela compra de energia elétrica a qualquer concessionário, permissionário ou autorizado de energia elétrica do mesmo Sistema Interligado.
§ 2º A partir de 1º de janeiro de 2020, os consumidores com carga igual ou superior a 2.000 kW, atendidos em qualquer tensão, poderão optar pela compra de energia elétrica a qualquer concessionário, permissionário ou autorizado de energia elétrica do mesmo Sistema Interligado.

Portanto, depreende-se do dispositivo acima que:

(i) a partir de 1º.07.2019 – os consumidores com carga igual ou superior a 2.500 kW poderão adquirir energia convencional; e

(ii) a partir de 1º.01.2020 – os consumidores com carga igual ou superior a 2.000 kW poderão adquirir energia convencional.

Atualmente, o limite mínimo para aquisição de energia elétrica é de 3.000 kW, além da necessidade de observar a tensão do consumidor (requisito da tensão será desobrigado a partir de 1º.01.2019).

Segundo a Nota Técnica nº 18/2018/CGPT/DGSE/SEE do MME, a análise da Lei nº 9.074, de 07 de julho de 1995, permitiu concluir que “o poder concedente fica autorizado a diminuir os limites de carga e tensão estabelecidos nos referidos artigos”.

No que tange aos impactos das citadas medidas, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica – (ANEEL), a alteração dos limites representa um “novo estímulo a competição, sendo esperada possível redução de preços no ambiente até então restrito às fontes especiais”.

É essencial frisar que o ofício da ANEEL não apresenta nenhum posicionamento acerca da redução dos limites por meio de Portaria.

O tópico a seguir tratará da competência do Poder Executivo de operacionalizar a redução dos limites. Vejamos:

(b) Da Competência do Poder Executivo

O art. 15, § 3º, da Lei nº 9.074, de 1995, prevê que o Poder Executivo poderá diminuir os limites de carga e tensão, nos termos a seguir:

Art. 15. Respeitados os contratos de fornecimento vigentes, a prorrogação das atuais e as novas concessões serão feitas sem exclusividade de fornecimento de energia elétrica a consumidores com carga igual ou maior que 10.000 kW, atendidos em tensão igual ou superior a 69 kV, que podem optar por contratar seu fornecimento, no todo ou em parte, com produtor independente de energia elétrica.
[…]
§ 3o Após oito anos da publicação desta Lei, o poder concedente poderá diminuir os limites de carga e tensão estabelecidos neste e no art. 16. (grifos nossos)

Em complemento ao dispositivo acima, o art. 16 da Lei nº 9.074, de 1995, dispõe acerca da livre escolha da fonte pelo consumidor. Vejamos:

Art. 16. É de livre escolha dos novos consumidores, cuja carga seja igual ou maior que 3.000 kW, atendidos em qualquer tensão, o fornecedor com quem contratará sua compra de energia elétrica. (grifos nossos)

Portanto, a leitura dos dispositivos acima permite concluir que é possível ao Poder Executivo (Presidente ou Ministério de Minas e Energia) estabelecer a redução dos limites de carga e tensão para a aquisição de energia elétrica convencional, uma vez que ambos atuam como Poder Concedente.

Todavia, é necessário avaliar se o instrumento mais adequado seria a Portaria ou Decreto.

(c) Da Portaria e Decreto

A seguir a definição doutrinária de acordo com a obra de Marcio Pestana:

Portaria: “é um ato administrativo de aplicação bastante ampla e fluída, tanto sendo, na prática, emitida por chefe da Administração Pública Municipal, como por ministros de Estado, secretários etc”.

Segundo Marcio Pestana “a portaria é ato que dá impulso ao exercício das funções administrativas, instalando comissão de inquérito, transmitindo orientações ao pessoal interno, preenchendo cargos, formando grupos de trabalho etc”.

A portaria pode ser definida, ainda, como ato jurídico do Poder Executivo, que contém ordens ou instruções acerca dos dispositivos legais.

Decreto: “é o ato administrativo utilizado exclusivamente pelo chefe do Poder Executivo. Sendo assim, é emitido pelo presidente da República, governadores e prefeitos, seja com finalidade predominantemente regulamentadora, seja organizacional-funcional”.

Nesse sentido, a emissão do Decreto pelo Presidente da República está diretamente relacionada à sua competência constitucional de determinar o cumprimento e regulamentação da lei, nos termos do art. 84, IV, da Constituição Federal, desde que expressamente previsto na lei.

Em que pese a doutrina tenha uma divergência conceitual acerca da definição dos citados instrumentos, de acordo com a definição literal, é possível concluir que o instrumento mais adequado para promover a redução dos limites mínimos para aquisição de energia elétrica seria o Decreto e não a Portaria.

Destaca-se que a alteração por decreto possibilitaria, ainda, o ajuste da definição de consumidor livre prevista no Decreto nº 5.163, de 30 de julho de 2004.

(d) Conclusão

Deste modo, conclui-se que (a) o art. 15, § 3º, da Lei nº 9.074, de 1995, concedeu ao Governo Federal competência para reduzir os limites mínimos para aquisição de energia elétrica dos consumidores; e (b) em consonância com a definição doutrinária do tema, o instrumento mais adequado para promover essa alteração seria o Decreto.

É importante frisar que:

(i) após a redução dos limites mínimos, será necessário adequar o art. 16 da Lei nº 9.074, de 1995, porém esse ajuste não inviabiliza e/ou condiciona a alteração a ser realizada pelo Poder Concedente.

(ii) embora o ofício nº 421/2018-DR/ANEEL trate dos impactos para os consumidores, o referido documento não apresentou de forma satisfatória o impacto da aquisição de energia elétrica convencional, bem como a redução na aquisição de energia incentivada, pois a percepção de grande parte do mercado é que a estrutura atual do setor elétrico não permite uma competição justa entre as fontes convencionais e incentivadas.

As respostas dessas questões são essenciais, pois é uma tendência natural que os agentes beneficiados com a redução dos limites optem pela aquisição de energia convencional, principalmente, nos casos em que a aquisição de energia elétrica convencional for mais vantajosa do que o custo da aquisição de energia elétrica incentivada e seu desconto na Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD).

Por fim, é indiscutível que essa redução de limites representada um grande avanço para o mercado de energia, mas é essencial que seja implementada garantindo a segurança jurídica, legalidade e, principalmente, a análise e previsibilidade dos seus efeitos no tempo, pois o setor elétrico brasileiro não pode mais conviver com medidas pontuais desordenadas que, posteriormente, geram efeitos negativos em cadeia.