Estudo identifica perfis profissionais do futuro para área de energia
Potencial de expansão das renováveis no Ceará e no país já aumentaram demanda por empregos como técnico em manutenção, operador de usina, instalador fotovoltaico e planejador energético
Delineando um futuro em que as fontes renováveis, a eletrificação dos transportes e a eficiência energética estarão cada vez mais consolidadas na matriz elétrica nacional e no dia a dia da população, o Núcleo de Energia do Observatório da Indústria da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), em parceria com o Observatório da Indústria e o Sebrae, empreendeu dois estudos com o objetivo de prospectar quais seriam as áreas com maior inovação e os perfis profissionais a serem demandados pela expansão tecnológica nos próximos 20 anos.
A partir de diversas contribuição de empresas, instituições, profissionais do setor, especialistas e variáveis como potenciais para cada fonte, regiões e tipos de tecnologia, foram identificados 25 perfis profissionais para esse futuro, ligados sobretudo as áreas de biocombustíveis, biomassa e resíduos, mobilidade elétrica, energia oceânica, termossolar e hidrogênio verde. No caso para ajudar o planejamento energético e a parte de regulamentação, foram destacados a gestão de monitoramento e automação, além de pontos específicos, como smart grids e sistemas fotovoltaicos e eólicos.
“Hoje temos uma expansão muito forte da fonte eólica e solar no estado, o que inevitavelmente irá ofertar empregos”, comentou Guilherme Muchale, coordenador do Observatório da Indústria da FIEC. Ele explica que atualmente o estado é o nono colocado em termos de geração de oportunidades na área no Brasil e que o trabalho de pesquisa é importante para garantir que os profissionais demandados pelo setor de energia sejam formados no tempo correto e dentro das características que a indústria irá necessitar, alinhado as questões tecnológicas presentes no mercado. “Há uma agenda muito forte de apresentação desses resultados para os principais centros de formação de mão obra e de pesquisa aqui do Ceará”, salientou.
Em termos de ocupações que mais cresceram ao longo dos últimos cinco anos, o levantamento aponta que as queimadas por tensão na rede elétrica impulsionam a busca por técnicos em manutenção nos parques geradores e em trechos de linhas de transmissão. “Só a demanda por profissionais nessas usinas cresceu 1000% no estado e mais de 40% no Brasil”, revela o coordenador. Já os eletrotécnicos e operadores das centrais elétricas tiveram salto de 200%, enquanto engenheiro eletricista ficou com aumento de 130% na região e de 13% na análise nacional, o que mostra efetivamente o quanto o setor elétrico tem se desenvolvido no estado, que no último leilão em termos de projeto de energia solar angariou quase 80% do total dos projetos vencedores.
Muchale atribui os resultados a projetos estratégicos, desde a modernização ambiental que aconteceu no estado ao Atlas Solar e Eólico, a ser lançado nesta terça-feira, 22 de outubro, e que serve para atrair potenciais investidores para novos projetos no estado. Além disso, há um grupo de trabalho para melhorias relacionadas as linhas de transmissão. “Além de ser um dos estados com melhor potencial solar e eólico do Brasil, também temos uma das melhores situações para as LTs, o que assegura projetos no próximo leilão”, pontuou.
Quanto ao potencial eólico offshore, identificado em 117 GW para a região, o especialista entende que a tendência é que haja uma primeira atuação mais ligada a experimentação, pesquisa e visualização de apontamentos, para depois haja uma participação mais forte desses parques. “Ao longo dos próximos anos podemos ver esses projetos nos futuros leilões”, indica.
Para ele, o governo poderia ajudar na questão com algum fomento específico, já que o Ceará tem potencial para a fonte, que inclusive é complementar à hídrica, e que pode ajudar o estado nos momentos em que os níveis dos reservatórios estiverem baixos, e principalmente porque o pico de produção de energia eólica naquela localidade é exatamente no horário de pico da demanda. “Esse complemento viria de forma sustentável, se encaixaria. Por isso, temos que ter oferta de educação preparada tanto para demanda comum quanto para esse avanço offshore”, explica.
Desenvolvimento do setor
O Núcleo de Energia do estado vem atuando desde 2015, no sentido de construir um ambiente diferenciado para o setor elétrico no Ceará, com as energias renováveis sendo considerado ponto estratégico para a região. “A ideia é fomentar diversas ações entre empresários, governo e acadêmica, no intuito de direcionar seus focos ao desenvolvimento do setor”, conta Guilherme, afirmando que a iniciativa é de construção coletiva, em que diversas entidades se reúnem para discutir e agregar no debate e definição desses perfis.
Ele afirma que para elaboração do arcabouço de profissionais que serão demandados no futuro foram empreendidos uma série de estudos preparatórios, desde mapeamento dos principais pesquisadores e das empresas que trabalhavam com essas tecnologias mapeadas, além da própria identificação das tendências a nível mundial, com um levantamento prospectivo.
Em um segundo momento foi feito um painel de especialistas, onde foram protocoladas 40 contribuições entre atores da academia local, empresários estaduais e internacionais, que foram sistematizados, através de entrevistas em aprofundamento, para chegar nesses resultados, cujo objetivo é principal é reorientar toda a oferta normativa para o setor. “O próprio Senai Ceará tem feito um trabalho importante, como por exemplo na formação de instalador de painel fotovoltaico”, ressalta.
Além de discutir as ocupações atuais, Muchale conta que foram debatidas as inovações tecnológicas que podem nortear pontos importantes, como a maior utilização de automação nas indústrias, que de certa forma pode contribuir para equipamentos de geração de energia e baterias, ou mesmo a questão do big data e analytics, que reúnem todos os dados numa plataforma e ajudam a indústria 4.0 a ter o controle de acompanhar as operações em tempo real.
Segundo ele, os assuntos de maior demanda para a própria sociedade são as ligadas a bioeconomia e a descarbonização, e que irão levar a uma demanda crescente no uso de energias renováveis, com a tendência de um mercado que terá um impacto muito forte na diversificação da matriz energética. Célula combustível, economia do hidrogênio, armazenamento de energia, eficiência e eletrificação de veículos, marco regulatório e mercado livre, infraestrutura de distribuição e parques eólicos offshore são alguns dos exemplos.
Sobre a formação técnica desses profissionais, o coordenador afirmou que hoje o estado possui aproximadamente 3,2% do total de cursos técnicos do país relacionado a energia, sendo 2% do total de graduações ligadas a área e 3,5% do total de graduações no Brasil.
Novidades e potenciais para a região
Para Guilherme Muchale, o Atlas Eólico e Solar do estado recém atualizado é uma contribuição pertinente para demonstrar que de fato o Ceará possui umas das maiores potenciais em termos de geração de energia no Brasil, o que acaba sendo uma questão importante também sob ponto de vista social, visto o avanço das energias renováveis e novas tecnologias representarem uma oportunidade de desenvolvimento ao Nordeste e ao Brasil.
Resultado de um convênio entre Adece, Fiec e Sebrae/CE, o novo Atlas tem por objetivo atualizar o potencial eólico e solar do estado, visando fomentar o aproveitamento dos extensos recursos naturais e renováveis e propiciando a atração de investimentos e também a construção de cenários futuros quanto ao uso do vento e do sol para gerar eletricidade. É um mapa interativo, onde o usuário pode entrar e colocar um ponto específico para seu conhecimento, sabendo exatamente qual o potencial a partir de um perímetro específico.
Essa edição apresenta características e funcionalidades inovadoras além da versão online e interativa, como opção de aplicativo no celular, mapeamento eólico offshore e híbrido para solar e eólica, além de um simulador para geração distribuída, que indica a ordem de grandeza da necessidade de painéis fotovoltaicos em determinado local. Integram essa lista também o enfoque estratégico do Governo estadual em áreas prioritárias para geração de energia e a apresentação das redes de transmissão e distribuição do estado, com a identificação também de terras que não servem para agricultura e que podem se tornar pertinentes para energia solar.
Na visão de Jurandir Picanco Jr, Coordenador do Núcleo de Energia FIEC, a publicação serve para melhorar a atratividade de projetos do tipo para investidores, haja visto que o aproveitamento energético depende do conhecimento da qualidade dessa energia em cada local. “As informações fomentam estudo e pesquisas, com o maior interesse final sendo a geração de negócios para o estado”, define, dizendo que os principais interessados nos levantamentos são, além dos investidores, os proprietários das terras, estudantes, analistas e empresas, no intuito final de gerar negócios.
O Atlas fornece recursos específicos para os usuários, como um simulador de viabilidade econômica do empreendimento, além de ferramentas e dados que auxiliam na definição e tomada de decisões de projetos, como a proximidade de rede de distribuição, velocidade média dos ventos, fator de capacidade de média de geração, irradiação anual, irradiação direta, entre outros.
Os potenciais atualizados são de 643 GW para a produção solar fotovoltaica, com o estado repleto de oportunidades neste segmento, seguido por 117 GW da geração eólica offshore, com fatores de capacidade muito elevados e em baixas profundidades. Já os negócios onshore ficaram com 94 GW de potencial a 100 metros, com o perfil de geração horária sendo diferenciado no estado, pois tanto pode gerar energia nos horários em que mais existe a necessidade, como também em meses com maior complementaridade com as hidrelétricas. Já o potencial híbrido ficou em 43,9 GW eólicos a 150 metros, e de 93,3 GW solares, utilizando 7,3% da área do estado.
Para Jurandir, são muitas oportunidades econômicas que podem advir a partir desse conhecimento. Segundo ele, o ambiente de negócios já começa a render frutos, a exemplo do projeto eólico de Trairi (CE), e dos solares em Mauriti (CE) e Milagres (BA), também para o mercado livre, o que mostra pujança desse setor, que mesmo num momento de retração econômica no país mostra crescimento a cada mês. “Temos aqui no Ceará um potencial diferenciado para geração de energia no horário de pico, durante o dia e início da noite, energia que está sendo cada vez mais valorada pelo Governo Federal, por meio dos leilões”, avalia.
Sobre a expansão da fonte solar, com 220 MW instalados atualmente e aproximadamente R$ 1 bilhão em investimentos, ele comenta que as iniciativas ainda estão no início, mas revela haver 700 MW da fonte contratados, o que representa mais de cerca de R$ 3 bilhões em investimentos. “Somando as duas fontes, temos aproximadamente R$ 14 bilhões em recursos tanto já realizados quanto a realizar”, pontua, afirmando que 15 mil empregos já foram gerados no estado, de um total de 30 mil previstos.
Já quanto aos projetos eólicos, Picanco Jr destaca os 2 GW implantados no estado, o que representa 14% de toda capacidade instalada no país e cerca de R$ 10 bilhões investidos apenas em parques eólicos. “Temos por aqui a Vestas, Wobben e a Aeris como fabricantes, o que mostra que estamos bem competitivos nesse segmento”, lembra.
Recentemente, Joaquim Rolim, Coordenador do Núcleo de Energia da Casa da Indústria – Sistema FIEP, parabenizou a Aneel e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) por estarem avaliando a implantação da geração de energia eólica offshore no Brasil, citando que apenas no litoral do Ceará há um fator de capacidade médio de 62%, sendo mais da metade deste potencial em profundidades inferiores a 20 metros. “A título comparativo, o fator de capacidade médio de geração eólica onshore no Brasil foi de 42,5% em 2018, que se situa em torno da média mundial offshore”, salienta.
Rolim diz haver diversas questões legais e regulatórias a serem explicadas, como por exemplo as discussões junto a Secretária de Patrimônio da União- SPU para uso da Costa, gastos maiores de conexão, eventuais compensações ambientais, e os custos da própria tecnologia. “Todos esses custos podem compensar caso a solução seja combinada com a exploração Tidal, e uma maior escala no emprego”, pondera. Vale lembrar que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama está atualmente analisando 4 processos de licenciamento de Eólicas Offshore, dois de grande porte e outros dois menores nos litorais do Ceará, Rio Grande do Norte e Bahia.