Sem chuva, bandeira amarela pode voltar antes do esperado
O período tradicionalmente úmido começou em dezembro, mas as chuvas surpreenderam especialistas e têm ficado abaixo da média histórica, elevando os preços de energia e antecipando as projeções de retorno da bandeira amarela, com cobrança adicional sobre a conta de luz.
Dezembro e janeiro já são considerados meses “perdidos” em termos de recuperação dos reservatórios das hidrelétricas. A depender do desempenho de fevereiro, mês importante no regime de chuvas anual, a bandeira verde pode dar lugar a amarela já em março, apontam especialistas.
O cenário mostra uma mudança importante em relação às projeções do início de dezembro, que apontavam que 2019 seria o ano com menores preços de energia desde 2011. Isso aconteceu devido à entrada de um bloqueio meteorológico, que criou alta pressão e comprometeu as chuvas em meados de dezembro.
“Perdemos um período bom de chuva em dezembro e estamos perdendo outro período para janeiro, impactando toda a projeção para o restante do ano”, disse Paulo Toledo, sócio-diretor da Ecom Energia. Segundo ele, o bloqueio pode se enfraquecer na última semana de janeiro, ou permanecer a comprometer também a hidrologia de fevereiro.
Desde dezembro, as chuvas têm ficado abaixo da média histórica. Para janeiro, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) projeta que as afluências no subsistema Sudeste/Centro-Oeste, que concentra a maior parte da energia hídrica do Brasil, ficarão abaixo de 70% da média.
Patricia Madeira, diretora e meteorologista do Instituto Climatempo, explica que a massa de ar quente que tomou conta de parte do Sudeste vai continuar até meados de fevereiro. Com isso, provavelmente, o volume de chuvas previsto para fevereiro também ficará abaixo da média histórica. O problema é que essa é justamente a época mais intensa do período chuvoso.
“Esta é a época que mais precisa chover para guardar água para o período seco. O efeito disso [menos chuvas nesse início do ano] está muito mais lá para a frente [para o inverno] do que para o que vai acontecer agora”, explicou Patricia.
Para João Carlos Mello, presidente da Thymos Energia, o acionamento da bandeira amarela vai depender das chuvas de fevereiro. O critério de acionamento das bandeiras leva em conta a projeção de chuvas e também o risco hidrológico (medido pelo fator GSF, na sigla em inglês). O retorno da amarela significaria um custo adicional de R$ 1,00 a cada 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos.
No mercado livre de energia, os preços já respondem à frustração das chuvas de verão. Na semana passada, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) informou que o preço de liquidação das diferenças (PLD) subiu 20% nos submercados Sudeste e Sul, para R$ 166,17/MWh.
A Comerc Energia trabalha com um PLD de R$ 193/MWh em fevereiro, saltando para R$ 278/ MWh em março. Segundo Cristopher Vlavianos, presidente da companhia, essa projeção é baseada nos dados de hoje, mas mudanças bruscas na hidrologia podem alterar o cenário. “Um mês atrás, a expectativa era que choveria muito. A chuva que se esperava não veio, e o efeito volátil foi a alta grande no PLD”, disse.
A mudança também foi sentida nos contratos de venda de energia. Segundo Vlavianos, em 15 de dezembro, a Comerc trabalhava com preço de R$ 125/MWh para fonte convencional com entrega entre janeiro e março. Hoje, os mesmos contratos estão em R$ 225/MWh. Para 2020, a fonte convencional subiu de R$ 180/MWh para R$ 200/MWh.
O desempenho dos preços ao longo do ano, contudo, ainda é incerto. “As chuvas estão vindo pior, mas ainda é cedo para bater o martelo e dizer se será um ano com preços altos ou baixos. Ainda há muita incerteza na hidrologia”, disse Luiz Barroso, presidente da PSR. “É importante considerar também a entrada de nova capacidade de geração da ordem de 5 GW a 6 GW só neste ano”, completou, explicando que isso ajuda a preservar reservatórios.
Segundo o presidente da Engie no Brasil, Maurício Bähr, o volume mais baixo de chuvas naturalmente provoca um aumento dos preços, mas é importante lembrar que o sistema possui hoje uma diversidade de fontes que asseguram o abastecimento.
“Nós ficamos esperando que chova no período úmido. E às vezes acontece uma frustração. Isso faz com que os preços sejam mais voláteis em razão disso. Mas acho que é um pouco da própria beleza do nosso sistema, que é diversificado, que tem tantas fontes e que pode contar com outras alternativas”, afirmou.
Apesar da possível volta da bandeira amarela, ainda não há motivos para preocupações com a inflação. As projeções indicam que o IPCA deve ficar abaixo da meta do Banco Central, de 4,25% para este ano.