Técnicos defenderão projeto de energia solar junto ao presidente

Técnicos defenderão projeto de energia solar junto ao presidente

Estudo do Ministério da Economia argumenta que reduzir subsídios para consumidores não é ‘taxar o sol’

BRASÍLIA E SÃO PAULO – Técnicos do setor elétrico no governo vão tentar convencer o presidente Jair Bolsonaro de que a proposta da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para os consumidores que geram sua própria energia não se trata de “taxar o sol” . O presidente usou esse argumento para criticar a proposta do órgão, apresentada na semana passada.

A proposta da Aneel para a geração distribuída, quando o consumidor gera a sua própria energia — normalmente por painéis solares —, está em consulta pública. O Ministério da Economia defende a medida como necessária para reduzir subsídios . Segundo a pasta, se as regras atuais forem mantidas, o custo para os demais consumidores até 2025 seria de R$ 56 bilhões.

Um estudo do ministério afirma que “taxar o sol” é uma frase de efeito cunhada por quem vai perder os subsídios e ressalta que as alterações apenas reduzem, não aumentam os encargos. “A diferença é que reduz o encargo que o cidadão comum pagaria, e que seria transferido a este grupo de interesse, que, agora, luta para mantê-lo”, diz o texto.

A mudança, polêmica, é defendida pelas distribuidoras de energia elétrica e divide especialistas. A Aneel propõe alterar as regras sobre a energia que o consumidor gera a mais e joga na rede da distribuidora. Pela regra atual, essa energia é devolvida pela empresa ao consumidor praticamente sem custo. Com isso, o cliente pode consumir quando não está gerando sua eletricidade.

Pela proposta, o consumidor passará a pagar pelo uso da rede da distribuidora e também pelos encargos cobrados na conta de luz. A cobrança será feita em cima da energia que ele receber de volta. Esses valores hoje são pagos por quem não tem sistemas de geração distribuída.

O ministério argumenta que, se o usuário quiser, pode se desconectar do sistema e armazenar sua própria energia em baterias. Mas quem permanecer “deve pagar proporcionalmente ao seu uso.”

Especialistas, investidores e consumidores avaliam que, se essa proposta avançar, vai desestimular novos investimentos no setor, travando o desenvolvimento de uma fonte de energia limpa. Desde 2012, foram investidos quase R$ 7 bilhões no país por consumidores, empresas e fundos que aplicam recursos em energia solar. Este ano, serão mais R$ 4 bilhões, segundo a Absolar, associação que representa empresas do setor.

A energia solar gerada pelos próprios consumidores representa hoje menos de 0,2% na matriz energética — um universo de apenas 145 mil consumidores, para um mercado potencial de 80 milhões, que ainda compram energia das geradoras. Especialistas e representantes do setor consideram que ainda é cedo para revisar as regras.

— Em outros países, houve mudanças no sentido de taxar a energia solar distribuída apenas quando essa fonte chegou a uma penetração de 5%. Mudar a regra com as coisas ainda andando traz muita insegurança jurídica e desestimula novos investimentos — diz Rodrigo Moita, professor do Insper e especialista no mercado de eletricidade.

O presidente da Absolar, Rodrigo Sauaia, calcula que são gerados, hoje, 100 mil empregos diretos e indiretos com a energia solar no país. Segundo ele, a proposta da Aneel desconsidera diversos benefícios, como diversificação da matriz energética e redução das emissões de gases de efeito estufa e poluentes.

Também causou estranheza a proposta da Aneel de reduzir o prazo de vigência das regras, de 25 para 10 anos, para quem já investiu na geração distribuída.

Para Surya Mendonça, presidente da Órigo Energia, que investiu mais de R$ 200 milhões na criação de fazendas solares (que alugam placas para pequenos estabelecimentos gerarem sua própria energia se não puderem instalar as placas no telhado), a proposta da Aneel é um desincentivo ao setor. Ele calcula que, no pior cenário, a atratividade pela energia solar distribuída vai cair até 60%:

— É uma mudança brusca de regras e inviabiliza o acesso à energia solar para quem não tem espaço para instalar os painéis no telhado.

A Órigo tem quatro fazendas solares em operação e conectadas com a distribuidora em Minas Gerais, gerando 3 mil MWh/mês, o suficiente para abastecer uma cidade de 50 mil habitantes. Vai inaugurar mais cinco fazendas até 2020. Tem como investidores a japonesa Mitsui, o fundo americano Texas Pacific Group e a gestora MOV.

Guilherme Susteras, sócio da Sun Mobi, que está construindo sua segunda usina de energia solar em Porto Feliz (SP), avalia que a Aneel deu uma guinada na proposta de cálculo que apresentou. Além disso, o prazo de discussão proposto — consulta pública de 45 dias — é exíguo.

A Frescatto Company, de pescados, usa energia solar desde 2016 e, este ano, pretende chegar aos 100% em sua operação. Além de adquirir parte dessa energia solar no mercado livre, a empresa investiu R$ 800 mil na compra de painéis solares para o prédio do setor administrativo, no Rio de Janeiro.

— Desde 2016, calculamos uma economia de R$ 2,5 milhões em gastos com energia. Buscamos mais a questão ambiental do que a financeira, mas é claro que se as regras mudarem, teremos impacto econômico — diz Cátia Monteiro, diretora de marketing da Frescatto.

Dono do Kobes Bar, em Belo Horizonte, Gustavo Henrique registrou economia de 10% na conta depois que começou a usar a energia solar:

— Para nós pequenos comerciantes, é vantagem. Com o que economizei, investi numa nova chopeira.