Aneel teme pressão tarifária de socorro ao setor
Diferentemente do que imagina o Ministério de Minas e Energia, as medidas previstas na MP 950 tem potencial para gerar pressão tarifária nos próximos anos, na avaliação da Agência Nacional de Energia Elétrica. A medida que traz o maior risco é a autorização para contratação de eventual empréstimo bancário de socorro às distribuidoras, com um modelo semelhante à solução adotada em 2014 para aliviar os impactos da crise hídrica sobre o caixa das empresas.
A isenção por três meses da conta de energia elétrica para consumidores beneficiários da tarifa baixa renda com consumo mensal até 220 kWh é neutra, em princípio, para os demais consumidores, em razão do aporte de R$ 900 milhões do Tesouro Nacional. Se houver, porém, demanda maior que a esperada e os recursos não forem suficientes, pode ser necessária uma complementação com recursos da Conta de Desenvolvimento Energético.
Dentro da agência, a avaliação é de que poder haver uma corrida sem igual pelo benefício, o que naturalmente vai impactar o saldo depositado na conta setorial. Se os recursos serão suficientes ou não, afirmam os técnicos, só o tempo dirá.
A Medida Provisória 950 foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União na noite da última quarta-feira, 8 de abril, com o objetivo de atender a necessidade de setores sociais mais vulneráveis aos efeitos da pandemia de coronavírus. Ela trata, ao mesmo tempo, do que seria uma solução para a queda de receita das distribuidoras com a redução do consumo e o aumento da inadimplência.
As contas em atraso ficam em parte resolvidas com o atendimento à baixa renda, e o que sobrar de inadimplência poderá ser renegociado pelas empresas com seus clientes, como já é feito atualmente. Há uma grande resistência por parte da agência reguladora em aceitar, porém, uma proposta que envolva a reedição dos empréstimos realizados no passado, já que o custo será pago pelo consumidor. Medidas alternativas estão sendo estudadas dentro da Aneel para evitar que o setor elétrico tenha uma segunda Conta ACR.
A MP provavelmente será regulamentada por decreto, quando o comando genérico da MP poderá se transformar em diretrizes mais claras de como será montada a solução. Dirigentes da Aneel consultados pela Agência CanalEnergia garantiram que não existe ainda nenhuma solução desenhada. O que há é a hipótese de se ter um financiamento nos moldes da conta ACR, mas o entendimento interno é de que é possível pensar em uma “tábua de salvação” para as distribuidoras, desde que ônus não seja assumido somente pelo consumidor.
A Aneel montou uma sala de situação coordenada por todos os diretores, em um momento visto como de coesão da Diretoria Colegiada. Todas as alternativas possíveis para que o setor consiga enfrentar a crise estariam sendo estudadas, mas a autarquia pretende aproveitar o momento para estruturar e preparar o setor para a retomada do crescimento no pós-crise. Ações imediatas e também de curto e de longo prazos estão em discussão, de olho no chamado D+1.
Impactos de uma variação cambial que já era significativa mas foi amplificada pela pandemia do Covid-19 já começam a aparecer no processos tarifários das distribuidoras do Centro-Sul, que compram energia da usina hidrelétrica de Itaipu. O aumento dos custos de transmissão também é um fator que tende a pressionar as tarifas.
Para dirigentes da Aneel, não há como evitar a pressão cambial, mas o endividamento com um spread elevado em razão do aumento da percepção de risco vai comprometer ainda mais a receita futura garantida pelos consumidores e levar a novos aumentos tarifários. A solução resolveria uma parte da questão, mas teria efeitos adversos com relação a pressões tarifarias futuras.
Diante desse cenário, qualquer solução que se venha a ter deve tentar aliviar todas as pressões esperadas nos próximos anos. Um exemplo prático seria securitizar os recursos que vão para os programas de pesquisa e desenvolvimento das empresas pelos próximos cinco anos, em vez de embutir esse custo na tarifa como um recebível. Pode se pensar em formas de como usar outros recursos intrassetoriais e se pensar em como Itaipu, por exemplo, pode contribuir com esse momento, tendo em vista que o empreendimento é uma das grandes fontes de arrecadação do Tesouro.