Consumidor não quer subsídios, quer opções
Fim do subsídio para fontes incentivadas proposto pela MP 998/2020 torna o setor mais competitivo, mas precisa andar de mãos dadas com a abertura do mercado livre de energia.
Publicada no início do mês, a Medida Provisória nº 998/2020, que agora tramita no Congresso, contempla uma série de medidas vistas com bons olhos por diferentes agentes do setor elétrico. O documento foi apelidado de MP do Consumidor, porque objetiva amenizar os impactos da Conta-Covid, evitando um aumento expressivo nas tarifas de energia a partir do próximo ano. Mas, além de prover alguns recursos financeiros para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), a MP também propõe mudanças substanciais no mercado de energia – entre elas o fim do desconto nas tarifas de transmissão e distribuição para novas usinas de geração que utilizam fontes renováveis ou incentivadas.
O incentivo existente, que reduz entre 50% e 100% o valor da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) para energia gerada a partir das fontes eólica, fotovoltaica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), foi criado há mais de duas décadas para estimular a expansão e ampliar a participação das renováveis na matriz energética brasileira. Ao longo deste período, e mais especialmente nos últimos 10 anos, no entanto, as fontes renováveis se beneficiaram da evolução tecnológica e dos ganhos de escala: o investimento e o custo de geração reduziram significativamente.
Hoje as fontes renováveis formam um mercado suficientemente maduro e competitivo. Em alguns casos, usinas eólicas e solares já conseguem vender energia nos leilões do mercado regulado por preços inferiores aos de grandes hidrelétricas, e bem abaixo das térmicas que usam fontes fósseis. De fato, não há mais justificativa para um incentivo cujo custo soma cerca de R$ 4 bilhões por ano e é pago por todos os consumidores.
Todavia, as medidas de incentivo às fontes incentivadas foram o principal motivador para a criação de uma categoria de consumidores chamada de “especiais” – aqueles que participam do Ambiente de Contratação Livre (ACL), mas podem adquirir somente energia de fontes renováveis. Em outras palavras, uma reserva de mercado estabelecida para garantis a expansão dessas fontes. Agora, com a proposta de retirada dos subsídios, é necessário garantir a migração dos consumidores especiais para a categoria de consumidores livres.
Os consumidores especiais, cuja demanda de energia está entre 500 kW e 2,0 MW, representam um consumo aproximado de 4GWMed. Há também uma quantidade expressiva de consumidores de maior porte que têm interesse em adquirir energia limpa e renovável para cumprir compromissos de sustentabilidade, desde que a preços competitivos. O fim da reserva de mercado pode contribuir para a redução do preço da energia elétrica devido ao aumento da concorrência entre os tipos de energia convencional e especial. Além disso, o aumento da competitividade deve estimular investimentos em inovação e modernização, aumentando a eficiência dos geradores e do sistema como um todo.
A Portaria 465/2019, publicada pelo do Ministério de Minas e Energia (MME), prevê para o início do próximo ano a abertura do mercado para consumidores com carga acima de 1,5 MW. Pelo calendário definido neste documento, os limites mínimos serão reduzidos gradualmente até que todos os consumidores acima de 500 kW tenham acesso ao mercado livre a partir de janeiro de 2023.
Aguardamos ansiosamente a realização dessa abertura – o que tornará a retirada de subsídios mais justa, ampliando as opções de escolha do consumidor.
A retirada de subsídios é salutar para o setor elétrico brasileiro – especialmente os chamados “subsídios cruzados”, nos quais o valor isentado a um grupo é pago por outros. A MP 998/2020 dá um passo importante nesse sentido. Como os demais subsídios existentes no setor elétrico, que caem na rubrica da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), o desconto nas tarifas de transmissão e distribuição para fontes incentivadas seguia a regra pouco eficiente de criar incentivos sem definir critérios e prazos para reavaliar os benefícios e determinar seu término. Mas as correções de rumo devem sempre acontecer em prol da ampliação do mercado e do aumento da competitividade, dando aos consumidores – o ser e a razão de ser do setor de energia – mais alternativas e melhores condições de escolha para suprirem sua demanda.
Carlos Faria é diretor-presidente da ANACE.
Confira a notícia completa em: https://www.canalenergia.com.br/artigos/53150571/consumidor-nao-quer-subsidios-quer-opcoes