Cresce temor de atraso em privatização da Eletrobras

Cresce temor de atraso em privatização da Eletrobras

Há um clima generalizado de apreensão entre empresários, autoridades da área energética e parlamentares quanto às perspectivas de privatização da Eletrobras ainda neste ano. Muitos acreditavam que a operação se tornaria prioridade máxima do governo após o engavetamento da reforma da Previdência. Agora, no entanto, aumenta a percepção de que o calendário eleitoral pode inviabilizar a ideia de capitalização da estatal em 2018.

O retrato mais cru da situação política foi dado pelo deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), relator na Câmara do projeto de lei sobre o tema, que reclamou duramente da desmobilização do Palácio do Planalto e da base aliada no encaminhamento das discussões. “O governo deixou o projeto à própria sorte”, afirmou Aleluia, em seminário organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre a privatização da Eletrobras. “Falta foco. O governo precisa entender que há coisas na vida que só se consegue com muito esforço. Não adianta pensar que esse projeto anda de forma natural. Não anda”, acrescentou.

Na terça-feira, manobras regimentais de parlamentares da oposição – em especial do PT – bloquearam avanços da comissão especial em funcionamento na Câmara dos Deputados, que não votou requerimentos para audiências públicas. Durante boa parte da sessão, só havia um representante de partidos da coalizão governista. O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS) saiu para atender uma ligação telefônica e não voltou mais. Ontem, uma reunião da comissão marcada para 14h30 foi suspensa pelo presidente Hugo Motta (PMDB-PB) sem explicações aos colegas.

O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, admitiu preocupação com o andamento dos trabalhos. “Lógico que preocupa, porque a gente tem um cronograma. Agora, obviamente, já esperávamos essa resistência.”

Dois lobistas do setor elétrico com vasta experiência no Congresso Nacional foram questionados ontem pelo Valor sobre o que têm dito aos seus clientes a respeito das chances de privatização até dezembro. Reservadamente, ambos disseram que consideram “baixa” a possibilidade de a operação concretizar-se neste governo. A avaliação coincide: há maioria de opiniões favoráveis entre os parlamentares à proposta do governo, mas ninguém quer se expor publicamente em defesa da ideia, sobretudo nas bancadas do Nordeste e de Minas Gerais.

O próprio Coelho Filho, que deixa o ministério no dia 5 de abril para retornar à Câmara e provavelmente tentará um novo mandato como deputado federal por Pernambuco, lamentou acusações feitas em seu Estado. “Estão dizendo que vamos privatizar o São Francisco”, disse o ministro, antes de propor uma comparação. “São Paulo tem 41 usinas privadas em seus rios. E lá ninguém acha que privatizaram o rio Tietê ou o Paraná. Aqueles que afirmam que estamos entregando a empresa não se deram ao trabalho de ler a proposta.”

Por isso, Coelho Filho dirigiu-se aos dirigentes da CNI na plateia e fez um apelo para que eles defendam a aprovação do projeto em um corpo a corpo com parlamentares. “Vocês têm contatos, influência, capilaridade”, pediu o ministro, em um estilo semelhante ao adotado pelo governo em outras ocasiões, como nas vésperas da anunciada – e frustrada – votação da reforma previdenciária.

Em meio às dificuldades de discussões na comissão especial, o relator Aleluia aventou uma possibilidade pouco comum na tramitação de projetos de lei: apresentar seu parecer para votação diretamente no plenário da Câmara. O plano de trabalho que ele pretendia ter lido anteontem na comissão – e não conseguiu por causa do barulho da oposição – prevê sete audiências públicas e entrega do relatório no dia 17 de abril. A votação no colegiado seria na semana seguinte.

Além da privatização da Eletrobras, causa temores no governo e no setor privado o andamento da proposta de reforma do setor elétrico como um todo, que também poderia ser afetada pelo calendário eleitoral. “Pode complicar um pouco do ponto de vista político, mas esse modelo conta com uma convergência de opiniões muito grande. Não creio que haverá uma oposição muito grande”, opinou o presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Fonseca Leite.

O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Paulo Pedrosa, completou: “Vejo, em alguns momentos, até uma oposição radical e extrema. Mas o ano eleitoral propicia essa discussão: vamos mudar ou continuar onde estamos? Tenho muita convicção de que a visão do próximo governo para o setor [elétrico] estará pautada pelo que estamos discutindo agora.”