Disputa entre transmissoras e eletrointensivos pode custar R$ 1,5 bi

Disputa entre transmissoras e eletrointensivos pode custar R$ 1,5 bi

Uma disputa judicial entre as transmissoras de energia e as grandes companhias eletrointensivas pode resultar numa conta de R$ 1,5 bilhão que poderá ser arcada pelos consumidores.

A Abrace, associação que representa os grandes consumidores de energia, está liderando uma ação judicial contra o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) pedindo uma liminar para não pagar as indenizações dos ativos antigos de transmissão que não foram amortizados.

O MME e a Aneel têm até hoje para se pronunciarem no processo. Será apenas depois disso que a Justiça vai decidir se concede ou não a liminar aos consumidores.

As indenizações se referem aos ativos de transmissão anteriores a maio de 2000 que tiveram as concessões renovadas antecipadamente nos termos da Medida Provisória (MP) 579, convertida na Lei 12.783, que instituiu o regime de cotas de garantia física e potência, com foco na modicidade tarifária.

O problema é que o montante das indenizações, de R$ 62,2 bilhões, será cobrado de todos os consumidores de energia por meio da tarifa, e repassado às transmissoras ao longo de oito anos, a partir de julho.

Os autores da ação, que incluem também a Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro (Abividro) e a Associação Brasileira dos Produtores de Ferroligas e de Silício Metálico (Abrafe) argumentam que as indenizações deveriam ser pagas pela União, e não via tarifa.

Dos cerca de R$ 62 bilhões que serão pagos – dos quais mais da metade se refere à atualização dos valores históricos -, os grandes consumidores irão arcar com cerca de R$ 12 bilhões. Apenas nesse primeiro ciclo tarifário, o efeito da cobrança nas empresas autoras da ação é de R$ 1,5 bilhão.

Como o governo enfrenta uma situação fiscal delicada, dificilmente o Tesouro teria recursos para pagar este montante, que provavelmente seria bancado pelos consumidores no caso de uma liminar favorável.

“No fundo, os grandes consumidores estão tentando se livrar da parcela que é cabível a eles. Não estão defendendo todos os consumidores, até porque eles vão pagar de qualquer maneira, como consumidores ou como contribuintes”, disse o advogado Orlando Magalhães Maia Neto, do escritório Ayres Britto, que representa a Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica (Abrate).

A associação ainda não é parte do processo, mas tem interesse direto na causa, uma vez que o recebimento das indenizações pode ser prejudicado por uma eventual decisão judicial.

Um dos argumentos do processo é que as indenizações não se referem ao serviço público que é prestado pelas transmissoras de energia. Dessa forma, não se pode financiar a despesa por meio da tarifa, que é cobrada de todos os consumidores de energia.

A visão de Neto, porém, é outra. “É a amortização de investimentos que foram feitos e que se converteram em serviços prestados aos consumidores”, disse. “Essa judicialização traz uma insegurança grande para o setor”, disse ele, explicando que, se uma liminar for concedida, precisarão ser anuladas reajustes tarifários já concedidos que consideram os pagamentos, como o da Energisa Borborema.

Na visão de Lucien Belmonte, superintendente da Abividro, a cobrança de todos os consumidores “carece de razoabilidade e legalidade”, uma vez que não se pode fazer toda a sociedade pagar uma conta dessa magnitude.

A dimensão do valor cobrado também é questionada pelos consumidores. “O custo de reposição daria para comprar de 70% a 80% do parque de transmissão do país”, disse Belmonte.

No processo, os consumidores apontam que as economias resultantes da MP 579 chegaram a R$ 25,5 bilhões, segundo cálculos da própria Aneel. “Mesmo que esses R$ 25,5 bilhões supostamente economizados fossem corrigidos pela taxa Selic até julho de 2017, […] esse valor não alcançaria o patamar de R$ 30 bilhões, ou seja, os benefícios proporcionados ficariam ainda muito aquém dos custos imputado”, diz o texto do processo da Abrace.

Essa informação também é rebatida pelas transmissoras. Segundo Neto, se não houvesse a renovação antecipada dos contratos em 2012, as concessões iriam até 2015, quando seriam apurados os ativos não amortizados. “Uma regra fundamental é que, em uma concessão, todo ativo empregado deve ser amortizado. Então, a conta chegaria em 2015”, explicou. Estimativas da Abrate indicam que essa conta corresponderia a cerca de R$ 40 bilhões.