Governo tem gasto bilionário com energia
A administração pública federal gastou R$ 2,4 bilhões com energia em 2017, segundo dados da ONG Contas Abertas. Especialistas afirmam que o volume é altíssimo e retrata como os desperdícios persistem. A título de comparação, o consumo das instituições e dos órgãos públicos foi de 1,224 bilhão de kwh, o suficiente para garantir esse serviço em 637,5 mil residências do país.
O valor pode ser equiparado, por exemplo, a todas as casas e os apartamentos do Distrito Federal, que pagaram, em 2017, R$ 1,03 bilhão em contas de luz, quando descontados os impostos. Somando os tributos, o montante sobe para R$ 1,3 bilhão, de acordo com informações da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
As despesas com energia na administração pública são impactadas, principalmente, pelo governo federal, que desembolsou R$ 2,083 bilhões no ano passado com o serviço, conforme dados do Ministério do Planejamento. Informações do Painel de Custeio do governo mostram que cerca de R$ 645 milhões do total foram gastos pelo Ministério da Educação, por causa das universidades federais. As entidades são responsáveis por R$ 445,8 milhões dos custos com energia.
O economista Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas, diz que, apesar do número elevado, a administração pública federal reduziu em 7% os desembolsos com energia entre 2016 e 2017. O Ministério do Planejamento também observou o mesmo movimento no período. A pasta ressalta que o gasto do Executivo caiu R$ 73 milhões no ano passado.
“O país vive uma grave situação fiscal e não tem como conter as despesas obrigatórias, que consomem a maior parte do orçamento. Então, há necessidade e preocupação em reduzir essas cifras. O governo está investindo nisso”, destaca Castello Branco. “Mesmo assim, o trabalho precisa continuar. Ainda há muito a se fazer. Os servidores ainda não se dão conta de que a luz, o ar-condicionado e outros aparelhos elétricos todos nós estamos pagando. De interruptor em interruptor, nós ainda gastamos R$ 2,4 bilhões”, emenda.
Exemplo empresarial
Por isso, Geraldo Biasoto, professor do Instituto de Economia da Unicamp e ex-coordenador de política fiscal do Ministério da Fazenda, ressalta que, quando se trata de energia elétrica, é preciso adotar medidas já implementadas no setor privado. “Esse volume de mais de R$ 2 bilhões é um escândalo absoluto”, critica. “Enquanto o setor público não tomar a iniciativa de controlar de forma mais efetiva, com estratégias inteligentes e informatizadas, o gasto continuará alto.”
Segundo Biasoto, as empresas fazem, atualmente, contratos “pré-pagos”, em que há um limite de despesas com energia. Dessa forma, os gestores precisam se adequar ao valor e reforçar o combate ao desperdício. “Ou, então, os órgãos e as instituições podem adotar um sistema informatizado em que é possível observar quais são os pontos em que há mais gasto, levando diretamente ao que destoa. Sabendo de onde vem o desperdício, é muito mais fácil de contê-lo”, explica.
O Painel de Custeio revela haver excessos nas despesas com a conta de luz dos órgãos. Separando o gasto por unidades orçamentárias é possível observar que foram desembolsados R$ 929,1 milhões apenas para a administração direta, ministérios, institutos federais, autarquias especiais e fundações públicas em 2017.
Exagero
Economista da consultoria 4E, Bruno Lavieri afirma ser difícil apontar onde ocorrem os maiores desperdícios, mas explica que é preciso ter um uso mais eficiente dos recursos. “Quando se trata de R$ 2,4 bilhões, até assusta. É um número muito elevado, de fato. Claro, existem universidades e várias unidades dos órgãos espalhadas pelo Brasil que dão uma dimensão grande para isso, mas, sem dúvida, é possível fazer melhor uso dessas despesas. Várias medidas de contenção podem ser tomadas”, declara.
De acordo com Castello Branco, os Três Poderes poderiam estudar, por exemplo, a adoção de investimentos em energia solar, que poderiam render economias robustas a médio e longo prazos. “Essa forma de energia evoluiu muito nos últimos anos. Os painéis solares diminuíram de tamanho e de preço, tornando o investimento ainda mais viável. Portanto, a administração pública federal tem condições de estudar formas de redução de gastos. Essa é uma delas”, ressalta.
Já Lavieri avalia que, para esse tipo de investimento, é preciso contar com recursos em caixa, “algo que o governo não tem neste momento”. “Talvez seja mais interessante deixar para os próximos anos, porque as instituições estão com poucos recursos no orçamento”, pondera. “O que eu vejo é que o governo poderia fazer melhor regulação do setor de energia, que foi um dos que mais sofreram com a crise econômica dos últimos anos. A ideia é definir regras mais claras de redução do custo da produção, aliviando as contas”, opina o economista.
Garantia de economia
A Câmara dos Deputados informa que economizou R$ 1,3 milhão com as despesas de energia elétrica entre 2016 e 2017, saindo de R$ 14,5 milhões para R$ 13,2 milhões. “Em comparação à série histórica, os valores do consumo de 2017 são os menores registrados, salvo nos anos de 2001 e 2002, época em que houve a restrição de consumo imposta pelo governo federal”, frisa a assessoria de imprensa da Casa, lembrando da crise do apagão.
De acordo com a nota, a Câmara substituiu 13 mil lâmpadas por outras mais econômicas, modernizou elevadores, instalou sensores de presença nos banheiros e adotou medidas de desligamento de cargas elétricas no período noturno e nos fins de semana.
Já o Senado afirma ter gastado R$ 13,6 milhões com as contas em 2017, ante os R$ 13,9 milhões em 2016. Uma das medidas adotadas foi reduzir o horário de funcionamento dos equipamentos de climatização, responsáveis por cerca de 50% de todo o consumo de energia elétrica na Casa. “Com a implementação da medida, atualmente, esses equipamentos ficam ligados apenas em dias úteis, das 7h às 19h (ou até o término de sessão Plenária se essa terminar depois desse horário), o que gerou uma redução de 10% no consumo total”, ressalta a Casa. Os números apresentados por Câmara e Senado divergem dos disponibilizados pelo Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi)(veja quadro).
Preço da estética
O secretário-geral da Contas Abertas, Gil Castello Branco, afirma que na capital federal a conta de luz dos palácios e das casas legislativas é mais cara por conta da própria construção dos prédios. “Sabemos que são obras lindas do ponto de vista da estética, mas também não valorizam a luz natural. São locais escuros, que precisam de luz artificial”, explica.
O Tribunal de Contas da União (TCU) tem desenvolvido a racionalização do consumo de energia. “Citem-se, como exemplos de medidas em curso, redução do horário de funcionamento do sistema de climatização, ações para contenção de consumo em horários com maior tarifação, individualização de interruptores de acendimento de luz por salas e continuidade da substituição gradativa das lâmpadas fluorescentes por lâmpadas de LED em todas as dependências institucionais, bem como implantação de sistema de geração de energia fotovoltaica para atender os prédios do tribunal em Brasília”, informa o órgão.
Gasto menor, conta maior
No Judiciário, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) diz ter reduzido em 20% o consumo entre 2014 e 2017, com troca de lâmpadas e redução no período de funcionamento das centrífugas. Saiu de 11,4 milhões de kwh para 9,08 milhões de kwh. Mesmo assim, a despesa aumentou de R$ 4,4 milhões para R$ 6,3 milhões, por conta do encarecimento do serviço.