Linha de Belo Monte falha e Norte e NE têm apagão
Um problema “simples” na subestação Xingu, no Pará, provocou uma interrupção de quase um quarto da carga de energia no país, afetando, principalmente, as regiões Norte e Nordeste. A subestação pertence à concessão responsável pelo primeiro linhão que escoa a energia da megausina Belo Monte para o Sudeste, operada por um consórcio liderado pela chinesa State Grid com participação minoritária da Eletrobras.
Segundo informações do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a falha, que ocorreu às 15h48, provocou a queda de uma carga de 18 mil megawatts (MW), o que correspondia a 22,5% do consumo total no sistema naquele momento. Até o fechamento desta edição, a interrupção em alguns municípios do Nordeste já durava mais de quatro horas, tendo sido normalizada no restante do país.
O problema na subestação foi registrado em um disjuntor, dispositivo usado justamente para proteger instalações elétricas contra danos relacionados à sobrecargas ou curto-circuitos. Ele interrompe o circuito quando a corrente não funciona adequadamente.
Todos os Estados do Nordeste foram afetados, e quatro do Norte tiveram interrupção total: Amazonas, Pará, Amapá e Tocantins. Segundo o ONS, os sistemas Sul, Sudeste e Centro-Oeste ficaram desconectados do Norte e do Nordeste. A separação causou excesso de geração nas duas regiões, gerando praticamente um colapso no Nordeste. Quando acontece uma falha do tipo, um mecanismo automático de proteção do sistema elétrico nacional entra em ação. No entanto, o primeiro estágio do Esquema Regional de Alívio de Carga (Erac) não foi capaz de evitar o corte, apurou o Valor.
O problema fez com que o linhão deixasse de enviar 4.200 MW para o sistema. O normal, segundo uma fonte com conhecimento do assunto, seria o Erac cortar uma carga equivalente ao que deixou de ser transmitido, deixando o sistema equilibrado. Isso, porém, não aconteceu.
“Isso deveria ter sido suficiente para sustentar o sistema, mas aconteceu alguma coisa no meio que ainda não sabemos o que foi”, disse a fonte. “Temos que ver por que o esquema de alívio da carga não foi suficiente”, completou.
Em entrevista coletiva ontem à noite, o diretor-geral do ONS, Luiz Eduardo Barata, disse que o problema ainda está sendo investigado, mas tudo indica que houve falha nos equipamentos. “Todos os indicadores que temos são de que o sistema vinha operando com bastante robustez”, disse Barata.
Barata explicou que o evento causou uma pequena perturbação no Sudeste, Sul e Centro-Oeste, com impacto de maior gravidade no Norte e Nordeste. “Tivemos praticamente um colapso na região Nordeste”, contou.
Segundo ele, “é muito improvável” que tenha havido uma falha humana, e já foi descartada a hipótese de sabotagem no sistema. Se a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) identificar que a falha feriu a regulação, a empresa responsável pela operação do linhão, a Belo Monte Transmissora de Energia (BMTE), poderá ser punida.
Em nota, a State Grid disse que o desligamento está sob análise técnica da BMTE. “Não houve qualquer defeito nas linhas de transmissão em corrente contínua nem nas duas estações conversoras de corrente alternada para contínua e vice-versa”, disse a chinesa.
Inicialmente, suspeitava-se que a falha teria ocorrido por uma falha em testes na ampliação da capacidade do linhão de 2 mil MW para 4 mil MW. Segundo Barata, porém, os testes foram encerrados durante o fim de semana e não houve problema.
O diretor-geral do ONS descartou ainda qualquer possibilidade de o apagão ocorrido nesta quarta-feira ter sido causado por sobrecarga e problema de oferta de energia. “A expectativa é que o sistema hoje tem condições de atender toda a carga do país”, disse Barata ontem.
O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, também destacou a segurança do sistema elétrico brasileiro. “Foi um incidente que aconteceu em uma transmissão. Do ponto de vista do fornecimento, do abastecimento, estamos completamente tranquilos para poder enfrentar não só o ano de 2018 como os anos seguintes”, disse ele.
O ONS vai fazer uma reunião com todas as empresas envolvidas nesta sexta-feira ou na segunda-feira, disse Barata. Além da BMTE, também devem participar da conversa representantes do Ministério de Minas e Energia, Aneel, Chesf e Eletronorte. A conversa deve acontecer no Rio de Janeiro, onde fica a sede do operador do sistema. Um relatório sobre a análise da perturbação deve ficar pronto daqui 10 a 15 dias.
A recomposição da carga foi feita gradualmente, a fim de evitar novos problemas. Às 20h de ontem, cerca de 60% da carga do Nordeste tinha sido recomposta, e toda a carga do Norte havia sido normalizada. A expectativa era de recomposição total até o fim do dia.
O Valor entrou em contato com as principais concessionárias de distribuição de energia das áreas afetadas pelo apagão. Até o fechamento desta edição, porém, muitas delas ainda não tinham contabilizado os números dos consumidores afetados.
A italiana Enel informou que cerca de 4 milhões de clientes foram afetados no Ceará, onde a companhia é concessionária da Enel Distribuição Ceará (antiga Coelce). Outras áreas de concessão da companhia também foram atingidas. A Enel Distribuição Rio contabilizou 212 mil clientes em 13 municípios om o fornecimento afetado por 12 minutos. Em Goiás, a interrupção atingiu 110 mil clientes em 11 municípios. Destes, 80% tiveram o serviço normalizado em menos de 10 minutos.
Na área de concessão da Neoenergia, o Rio Grande do Norte teve interrupção do fornecimento em 167 municípios, atingindo 1,4 milhão de clientes. Em Pernambuco, foram 184 municípios, afetando 3,7 milhões de clientes. Na Bahia, 55 municípios do oeste do Estado não foram afetados. Com isso, houve falha no fornecimento para 360 municípios, o que afetou 5,4 milhões de clientes.
Em Minas Gerais, segundo a Cemig, 31 municípios ficaram sem energia por cerca de 10 minutos. Os maiores municípios afetados foram Pouso Alegre, Ribeirão das Neves, Uberaba e Uberlândia.