Carlos Faria, da Anace: Equilíbrio entre ACR e ACL

Carlos Faria, da Anace: Equilíbrio entre ACR e ACL

Associação está preocupada com o peso dos encargos e tributos na conta de luz, assim como com o vencimento das concessões.

A estrutura de contratação de energia atual, que privilegia o mercado cativo em detrimento do mercado livre vem desagradando a Associação Nacional dos Consumidores de Energia. Segundo Carlos Faria, presidente da Anace, é hora de rever essa estrutura, com vistas a promover o equilíbrio do mercado e sua ampla competitividade e expansão. Para o executivo, somente através da simbiose entre as estruturas do ACR e ACL será possível desenvolver um mercado de energia elétrica acessível a todos os agentes.

A Anace está preocupada ainda com o peso dos encargos e tributos na conta de luz, assim como com o vencimento das concessões. Para a associação, a renda hidráulica é o vetor para as concessões de geração, de forma tal que o desenvolvimento de um certame licitatório que destine 50% da energia para o mercado cativo e 50% para o mercado livre seria ideal para o alcance da modicidade tarifária para o ACR e preços competitivos para o ACL. A Anace também acredita que a licitação das concessões de transmissão e distribuição deve ter seus recursos direcionados à redução dos encargos setoriais.

 

Essas e outras questões do segmento serão debatidas pela Anace durante o Enase 2011 – 8º Encontro Nacional dos Agentes do Setor Elétrico, que acontecerá a partir da próxima quarta-feira, 5 de outubro, no Hotel Sofitel, no Rio de Janeiro. O Enase, que termina no dia 6, é promovido pelo Grupo CanalEnergia, em parceria com a ABCE (concessionárias), Abdib (Indústria de Base), Abiape (autoprodutores), Abrace (consumidores), Abraceel (comercializadores), Abrage (geradores), Abragef (geração flexível), Abraget (geradoras termelétricas), Abrate (transmissoras), Anace (grandes consumidores), Apine (produtores independentes), Abragel (geração renovável), ABCM (carvão mineral), ABEEólica (energia eólica), Abdan (nuclear) e Cogen (cogeração).

 

Leia abaixo a entrevista com Carlos Faria, presidente da Anace:

Agência CanalEnergia – Atualmente, quais são as maiores preocupações dos consumidores de energia?

Carlos Faria – Muitas são as preocupações dos consumidores de energia, entre elas podemos destacar o peso dos tributos, os problemas na rede que reiteradamente têm provocado interrupções, todos agravados com a proximidade do vencimento das concessões de geração, transmissão e distribuição, ainda sem solução por parte do poder concedente.

Agência CanalEnergia – Como a Anace avalia a competitividade da energia no Brasil?

Carlos Faria – A energia elétrica está cara. A carga tributária sobre a conta de luz é de 45%, enquanto que a carga tributária sobre a economia como um todo é de 35%. Convivemos com 36 rubricas entre tributos e encargos, desde as mais “clássicas”, como PIS/ Cofins e ICMS, até as menos conhecidas, como a RGR (usado pelo Luz para Todos), a CCC (que custeia a térmicas na Amazônia) e o ESS (que banca a geração térmica para economia de água nas hidrelétricas). O consumidor vive/assiste, hoje, um abuso arrecadatório: são 23 impostos e 13 encargos na tarifa de energia. No ano passado, foram pagos R$ 45 bilhões em tributos e encargos.

Agência CanalEnergia –
O que pode ser feito em termos de política governamental para mudar esse cenário?

Carlos Faria – Em 2011, a expectativa é de que o governo mantenha a política de prioridade para os projetos de fontes renováveis, trabalhando para que os licenciamentos das hidrelétricas sejam concluídos o mais breve possível, uma vez que, infelizmente, não foi dada a possibilidade de a sociedade brasileira rediscutir a adoção de grandes reservatórios de acumulação de água (com benefícios em saneamento, regularização, pesca, turismo, transporte, abastecimento de água e outros), para que não seja necessário recorrer à geração termelétrica a gás ou carvão que são mais poluentes e caras.
No Brasil, desde 1995 é possível se tornar um consumidor livre. O processo de migração para a liberdade de mercado foi lento em seu início, muito pelo medo do novo, e atinge hoje cerca de 25% do mercado nacional. Infelizmente a nova regulamentação do setor elétrico, após 2004, apesar de manter o mercado livre, desprezou as melhores condições de um desenvolvimento sustentável. O mercado livre tem o condão de induzir o uso eficiente da energia elétrica, permitindo o permanente equilíbrio entre oferta e demanda. Assim sendo, o governo precisa promover mudanças que permitam a ampliação do mercado livre com a liberação dos limites para elegibilidade dos consumidores a este mercado.

Agência CanalEnergia –
É possível reduzir os tributos e encargos que hoje representam grande parte da conta de luz?

Carlos Faria –
Sim, basta cumprir a promessa de campanha feita pela Presidente, que prometeu zerar tanto o PIS/Cofins de energia, como o de transporte e o de saneamento. Os encargos setoriais, juntamente com os impostos, respondem, em média, por aproximadamente 50% da conta de energia, que é composta ainda pelo custo da compra e do transporte de energia (transmissão e distribuição).
Dentre as possibilidades está a desoneração da conta de luz, com a mudança da cobrança do PIS/Cofins. O tributo poderia voltar a ser cobrado como antes de 2003, quando incidia cumulativamente em toda a cadeia do setor elétrico. Também é preciso que o governo reveja, com urgência, os encargos na tarifa de energia que são custos que existem apenas no setor elétrico. Pelo menos 14 deles estão embutidos na fatura do consumidor.

Agência CanalEnergia –
Como a Anace está vendo essa questão da renovação das concessões? Qual a posição da associação?

Carlos Faria – Desde 2008 a Anace vem se manifestando, inclusive junto ao Ministério de Minas e Energia, sobre essa questão. Preocupa-nos sobremaneira o fato de que grande parte da energia existente e sua movimentação e distribuição estão vinculadas a grandes concessionárias estatais, tais como Chesf, Cesp, Copel e Cemig, o que, aliado a grande pressão política, poderia conduzir ao favoritismo da renovação das correspondentes concessões, que, por sua vez, contribui para a reestruturação e fortalecimento da Eletrobras.
A Anace entende que, em nome da modicidade tarifária, não pode o Governo Federal comprometer a manutenção do mercado livre e contribuir para a escassez de oferta; nesse sentido, é de se frisar que o conceito de renda hidráulica precede ao conceito de modicidade tarifária, sendo esta verdadeira relação de causa e efeito. Não será implementada a modicidade tarifária, acaso faltem agentes privados que venham a investir em geração e contribuir para a manutenção e expansão do mercado.

Agência CanalEnergia –
Que solução seria a melhor do ponto de vista dos consumidores?

Carlos Faria –
Na visão da Anace, é chegada a hora de se revisitar a atual estrutura de contratações de energia elétrica, mesclando-se o Ambiente de Contratação Regulada – ACR com o Ambiente de Contratação Livre – ACL e vice-versa, com vistas a promover o equilíbrio do mercado e sua ampla competitividade e expansão. Somente através da simbiose entre as estruturas do ACR e ACL será possível desenvolver um mercado de energia elétrica acessível a todos os agentes e consumidores.

Agência CanalEnergia – A Anace está trabalhando em alguma proposta para apresentar ao governo em relação à renovação das concessões?

Carlos Faria – A Anace está convencida de que a renda hidráulica é o vetor para as concessões de geração, de forma tal que o desenvolvimento de um certame licitatório que destine 50% (cinquenta por cento) da energia elétrica produzida para o ACR e 50% (cinquenta por cento) para o ACL seria ideal para o alcance da almejada modicidade tarifária para o ACR e preços competitivos para o ACL.
É urgente entender que a modicidade tarifaria é boa, mas não ter players privados investindo em geração é perigoso. Neste cenário, as licitações das renovações concomitante à venda antecipada da energia que vence em 2012/2013 é uma oportunidade para fortalecer as empresas vencedoras, inclusive a Eletrobras, para participar com mais arrojo do crescimento do país. Também com igual sentimento de equilíbrio, a Anace acredita, e requer com imediatez, que a licitação das concessões dos serviços de transmissão e de distribuição deva ter os seus recursos direcionados à redução dos encargos setoriais que aviltam o custo da energia elétrica para todos os consumidores. Finalmente, tendo em conta o respeito ao vigente marco legal e regulatório do setor elétrico, a Anace ressalta que a licitação das concessões dos serviços de energia é o caminho que deve ser imediatamente adotado para a garantir a manutenção dos investimentos e a financiabilidade para novos projetos.
Fonte: Canal Energia