Novas regras cambiais do governo trazem benefícios ao setor de energia
Apesar da atualização das normas cambiais ser um pleito antigo das instituições financeiras, as empresas de energia podem se sair como grandes beneficiadas
A notícia de que o governo estuda a implantação de contratos em dólar no Brasil é bem-vinda por diversos setores dentre as iniciativas contempladas pela equipe de Paulo Guedes. No início do ano falou-se da visão de uma moeda conversível, que possa ser negociada internacionalmente e que sirva de referência para a América do Sul. Buscando inspiração no Euro, a proposta do Banco Central é consolidar o Real como moeda regional, de forma que possa ser usada também pelos países vizinhos, como Argentina (maior parceiro comercial do Brasil), como reserva de valor.
Essas iniciativas, juntamente com a tentativa de emplacar boa parte das medidas que compõem as exigências para o ingresso do país na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), como uma menor participação do Estado na economia e um mercado de capitais mais ativo, são parte importante do que o setor de energia precisa para diminuir a distância de seus pares internacionais.
Uma questão de hedge
Até hoje, o Brasil carece de instrumentos de hedge cambial para investimentos de longo prazo – um desafio determinante nas tentativas de captação de investidores institucionais para projetos e empreendimentos brasileiros. Somado à falta de instrumentos de convertibilidade dos recebíveis e de liquidez das transações, os investidores veem limitadas alternativas para a gestão dos riscos.
Entre as propostas consideradas, encontra-se a contratação de seguros garantidos por um fundo (Fundo Garantidor de Infraestrutura), a cargo de uma agência estatal, o que implicaria no aporte de recursos públicos para bancá-lo. Esta classe de mitigação de riscos por garantias soberanas constitui um típico instrumento de risk slicing praticado por países em desenvolvimento – a exemplo do que fez a Argentina no governo de Macri para energias renováveis.
Outras medidas contemplam contratos de swap cambial, de pelo menos 10 anos, ofertados pelo BC, além da isenção tributária para a colocação de títulos no mercado internacional. Com a permissão da conta em dólares, um dos efeitos mais imediatos da medida seria a redução dos custos relacionados às operações em moeda estrangeira, visto que empresas teriam mais meios de administrar recursos depositados no país.
Uma outra distorção que que deveria ser ajustada diz respeito à tributação de operações financeiras: nas operações de crédito, o hedge cambial é tributado anualmente quando a desvalorização do real gera resultado positivo. O mesmo não pode ser compensado nos anos em que a moeda se valoriza.
Dada a natureza de longo prazo dos projetos, haveria a necessidade de se convencer a Receita Federal de que a tributação deve ser sobre todo o período de duração do hedge, a exemplo do que é praticado em outros países.
É da concordância de todos que é urgente retomar o crescimento econômico (PIB) assim como investir na indústria de valor agregado como meio de reduzir a exposição do câmbio aos choques de commodities. Cabe lembrar, no entanto, que não há uma fórmula mágica e o sucesso dos esforços em modernizar o mercado cambial brasileiro está condicionado à credibilidade e resiliência do país.
Rachel Andalaft é sócia-fundadora da REA Consult e gestora junto a investidores institucionais