O ser e a razão de ser do Setor de Energia
Historicamente, quando um país enfrenta situação econômica adversa, parte do problema decorre do enfraquecimento do setor de infraestrutura, o que impacta diretamente na sua sustentabilidade e competitividade. Infelizmente, no Brasil não foi e nem é diferente!
Enquanto o setor de infraestrutura, incluindo o elétrico, vinha se mostrando deficiente para as necessidades do País, equivocadamente foram adotadas medidas desmedidas e populistas para a questão do custo energético. Previsivelmente, as medidas não se sustentaram, ao contrário, provocaram o desarranjo a que chegamos.
O setor elétrico vivencia novamente uma séria crise de condução e desenvolvimento, retardando e até mesmo impedindo o atendimento de seu equilíbrio e, principalmente, funcionalidade, o que ocorre simultaneamente com um cenário político econômico conturbado e de delicada recuperação.
No meio de toda essa paralisia e indecisão, há uma figura que pouco parece ter qualquer significado e importância para o setor, pois, afinal, como vulgarmente se formou por jargão “alguém tem que pagar a conta” e certamente o consumidor foi eleito à unanimidade tendo sido muito pouco ouvido ou até mesmo consultado.
Por conta da necessidade de se contornar o efeito perverso das medidas adotadas e do mau planejamento e na tentativa de retomar a estabilidade setorial, foram alteradas normas e práticas que oneraram drasticamente o consumidor. Desde então, várias são as propostas e discussões para a revisão do modelo institucional que vigora já por 15 anos e que se mostrou esgotado mesmo antes do desequilíbrio das contas públicas e da utilização da política tarifária como instrumento de política eleitoral.
Há, sem dúvidas, estudos e palpites bastante fundamentados e que merecem destaque para a continuidade da revisão e reestruturação setorial em andamento e iniciada com a Consulta Pública 33, promovida em 2017 pelo Ministério de Minas e Energia. Por outro lado, a interferência do legislativo e a indefensável defesa de interesses casuísticos ― ora de caráter político, ora por vaidade e sempre visando à postergação de privilégios ou interesses setorizados ― comprometem sensivelmente os objetivos pretendidos e prejudicam os trabalhos, mas, pior, prejudicam o País e a retomada do crescimento.
As soluções desenhadas para o conjunto dos problemas abordados na Modernização do Setor Elétrico anunciam novo aumento real, sem que isso venha a ser a principal preocupação setorial, verificando-se que as questões que podem recuperar e promover a competitividade do consumidor compõem a terceira e última “onda” de ações do Governo Federal para sanear o setor.
Essas questões, que afetam diretamente o segmento consumo, como a alocação de custos e riscos, a racionalização dos encargos e subsídios e a abertura do mercado, não devem nem podem ser deixadas para o fim do processo de recuperação setorial. Ao contrário, devem ser priorizados no conjunto de medidas destinadas à sustentabilidade e funcionalidade das diversas atividades e serviços de energia elétrica na medida em que de nada adiantará a geração, a comercialização, a transmissão e a distribuição viabilizadas se não houver um consumidor para lhes dar sobrevivência e manutenção.
Essa é a oportunidade para que os custos, precificação e tarifação da energia elétrica sejam tratados com o cuidado e respeito que merecem, sendo necessária uma forte mobilização dos consumidores e agentes setoriais para o estabelecimento de um mercado efetivamente competitivo, cujos preços e tarifas sejam justos e condizentes com a realidade nacional e internacional, pois, afinal, aí sim, “o ser e a razão de ser do setor de energia é o consumidor!”, sendo esse o lema a ser perseguido.
* Mariana Amim é graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com especialização em Negócios de Petróleo, Gás e Biocombustíveis pela Fundação Instituto de Administração – FIA; é Consultora Jurídica da Associação Nacional de Consumidores de Energia – ANACE e Sócia do escritório AMIM, SOCIEDADE DE ADVOGADOS.