Puxado pela indústria, consumo de energia já dá sinais de recuperação
O consumo de energia tem demonstrado indícios de recuperação neste início de 2017, principalmente na indústria e nos consumidores do mercado livre. A demanda no segmento residencial, porém, deve levar um tempo maior para se concretizar.
Enquanto ainda é cedo para falar de retomada de crescimento na demanda – principalmente no mercado cativo, das distribuidoras -, dados publicados recentemente pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) indicam pelo menos um indício de recuperação da atividade econômica e no consumo de energia.
Segundo Ricardo Savoia, diretor da consultoria Thymos Energia, há expectativa de leve recuperação no consumo de alguns segmentos eletrointensivos, como de produção de aço, laminados e ferroligas, refletindo a melhora na conjuntura internacional. Isso ajuda a explicar o comportamento do consumo de energia nesse início de ano.
O consumo de energia pela indústria cresceu 4,4% em janeiro na comparação anual segundo a EPE. A maior alta foi no segmento têxtil, de 20,4%, seguido pelo setor automotivo, com 15,1%, e pelo de borracha e material plástico, de 8,1%. “O resultado do consumo industrial de eletricidade talvez aponte uma possível transição gradual de estabilização da economia, embora sinais mais consistentes precisem ser observados para se afirmar isso”, diz o documento da EPE.
No acumulado em 12 meses, porém, o desempenho do consumo de energia na indústria continua ruim, com queda de 1,7%.
“Ainda estamos em um cenário de expectativa da recuperação da economia. O que vai dizer mesmo se haverá melhora significativa vai ser o desempenho do consumo de energia nesse primeiro semestre do ano”, disse Savoia.
A indústria é a primeira a responder devido ao retorno do uso da capacidade ociosa. “Como o Brasil está, espero eu, saindo de um período de recessão profunda, poderemos ter, principalmente no segmento industrial, uma elasticidade maior no consumo de energia”, disse Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil. “A indústria foi o setor que mais sofreu com a recessão. Na medida em que a economia se recupera e as máquinas voltam a girar, você tem um aumento maior do consumo. Esse tipo de sinal pode acontecer neste ano”, disse Sales.
A notícia, porém, não é necessariamente boa para as distribuidoras em termos de volume de energia distribuída. Devido ao grande número de consumidores enquadrados na categoria de especiais (com consumo de 0,5 MW a 3 MW) migrando para o mercado livre em busca de melhores preços de energia, a tendência no mercado cativo continua sendo de queda.
Além disso, o consumo de energia nos segmentos residencial e comercial demora mais para voltar, uma vez que a sociedade foi fortemente atingida pela crise, com o aumento do desemprego e diminuição da renda.
Savoia destaca ainda fatores como o acionamento da bandeira amarela em março, que encareceu a conta de luz do consumidor no mercado cativo e pode incentivar a adoção de novos esforços na economia de energia.
O consumo de energia no país permaneceu em queda no mercado cativo em janeiro, quando houve retração de 4,2%. Já o mercado livre, impulsionado pela migração de consumidores especiais, registrou alta de 25,6% no mesmo período. O mesmo tipo de comportamento foi identificado pela CCEE, que mediu o comportamento do consumo de energia no mercado livre por vários segmentos.
Em fevereiro, o setor de saneamento, por exemplo, registrou crescimento de 81,7% no consumo no mercado livre. Excluindo o resultado da migração de clientes, a alta seria menor, de 6,7%, mas ainda suficiente para indicar recuperação. No segmento de veículos, o consumo de energia teve alta de 35,9% em fevereiro, e expansão de 5,2% quando excluído o efeito da migração.
“O mercado livre cresce porque o cativo decresce. Isso vai gerar um grande problema para as distribuidoras que, pelo modelo até aqui vigente, são as contratantes de longo prazo. Como estão com excesso, e ocorrendo o leilão de descontratação, podem amargar prejuízos”, disse Roberto D’Araujo, consultor da ONG Ilumina, formada por técnicos do setor elétrico.
Outro fator que precisa ser levado em conta na análise dos números de consumo do início do ano é a temperatura. Para Nivalde de Castro, coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), da UFRJ, os números da EPE precisam ser vistos com cautela, devido ao número maior de dias úteis em janeiro de 2017 (22) em relação a janeiro do ano passado (20).
“Com isso, parece cedo para comemorar uma retomada mais consistente da economia. O que está se verificando no momento, em termos de atividade econômica é o aumento da produção em setores bem localizados e ainda sem previsão de uma retomada imediata de um crescimento mais consistente”, disse Castro.
De acordo com Renato Queiroz, pesquisador do Grupo de Economia da Energia (GEE), da UFRJ, ainda é cedo para afirmar que há uma retomada firme. “O calor tem sido forte, com altas temperaturas em muitas regiões no Brasil. E o uso do ar condicionado tem sido intenso”, disse.