Reforma do setor elétrico deve trazer mais autonomia e riscos às geradoras

Reforma do setor elétrico deve trazer mais autonomia e riscos às geradoras

Especialistas acreditam que a migração para o mercado livre de energia provocará a necessidade de mecanismos de controle para proteger tantos os agentes quanto os consumidores finais.

A reforma do setor elétrico deve conferir mais autonomia às geradoras, porém, também pode trazer mais riscos, principalmente em momentos de escassez da oferta. Para especialistas, uma regulamentação poderia dar mais estabilidade ao mercado. “É importante que os preços reflitam as necessidades do sistema, mas são necessários mecanismos que deem sustentação ao setor e protejam agentes e consumidores”, afirma o economista do instituto Acende Brasil, Richard Hochstetler.

O especialista desenvolveu juntamente com o professor da Escola de Economia de São Paulo – Fundação Getulio Vargas (FGV EESP), Daniel Monte, e o professor associado do Insper, Rodrigo Moita, um estudo sobre a geração de energia em um mercado competitivo. Os principais pontos foram apresentados em evento na instituição nesta terça-feira (20). No modelo proposto, os agentes são mais ativos junto ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). “O agente passa a ter autonomia para gerar riscos.

No modelo atual, ocorre de hidrelétricas serem forçadas a segurar reservatórios quando o preço está alto e acionadas para soltar quando o preço cai”, aponta Hoschsteller. Porém, a mudança exigirá ajustes para que a operação seja rentável em momentos de abundância, quando o preço de energia cai, e para proteger o consumir de tarifas abusivas em períodos de escassez. Entre as soluções propostas pelo estudo, está o estabelecimento de um teto e um piso de preço. “Os agentes podem contratar energia como quiser, mas um ente central controla a variação do preço: se o gerador cobrar acima do teto, tem que cobrir a diferença da tarifa.

Se o preço cair abaixo do piso, é ressarcido”, explica o economista do Instituo Acende. “A ideia é dar equilíbrio a produção e consumo. O grau de coordenação do mercado deve ser preciso e flexível.” O mecanismo também serve para proteger fontes de energia intermitentes em momentos de escassez. “É uma forma de lidar com os riscos para as renováveis e garantir sustentabilidade para as receitas”, afirma Monte. “O mercado é sim capaz de coordenar a geração, desde que tenha uma plataforma clara para formar o preço.”

Projeto de lei

Hoschsteller conta que as soluções apresentadas pelo estudo não estão incluídas no Projeto de Lei apresentado pelo Ministério de Minas e Energia (MME). “Começamos esse estudo há três anos, ainda nem existia essa discussão de mudanças. Calhou que estão bem alinhadas. O PL é uma proposta muito preliminar, que abre caminho para as possibilidades discutidas no estudo. A questão técnica nem deve ser tão detalhada no âmbito do congresso.” O Projeto de Lei, baseado nos resultados da Consulta Pública 33, foi encaminhado pelo MME à Presidência da República.

Vista pelo mercado como de extrema importância para a modernização do setor, sua aprovação é considerada incerta diante do atual cenário político conturbado. Para Daniel Monte, é difícil apostar que o projeto será aprovado em um ano eleitoral, mas vê as mudanças como inevitáveis. “Se não acontecer agora, vai ser depois, talvez com outra configuração. A certeza é de que o modelo atual é insustentável. Existe uma crescente insatisfação com o modelo atual. Hoje vivemos um movimento importante de mudança estrutural”, declarou durante o evento.

“Há alguns anos, era quase um tabu discutir mercado livre de energia. Hoje não é mais e podemos procurar entender se é viável e resolver as questões vigentes”, complementa. Moita aponta que o Brasil está passando por um processo similar ao que ocorre em países desenvolvidos, onde o setor elétrico seguiu para um modelo mais orientado pelo mercado. “Está chegando o momento dessa mudança. É a tendência global. O novo modelo é necessário, mas necessita de regulamentações.”